Brasil fecha 2021 com mais de 1900 pessoas resgatadas de situações análogas à escravidão
Em entrevista ao Conexões, o professor e juiz federal Carlos Haddad analisa e comenta dados divulgados pelo Ministério do Trabalho
O Brasil fechou o ano de 2021 com 1937 pessoas resgatadas de situações análogas à escravidão. Essa é a maior soma de resgatados desde 2013, quando quase 3 mil pessoas foram libertadas. Segundo o Ministério do Trabalho e da Previdência, responsável pelo relatório divulgado na quinta-feira, dia 27, foram realizadas 443 ações em todo o território nacional. 89% dos resgatados trabalhavam em atividades rurais, a maioria no cultivo de café, alho e na produção de carvão vegetal. Enquanto dos 11% resgatados em cidades, a maioria estava em empreendimentos imobiliários e na construção civil.
Minas Gerais foi o estado com o maior número de ações e de resgatados. Ao todo, foram quase 800 pessoas libertadas em território mineiro. Dos resgatados, 90% eram homens, 80% eram negros, 47% eram nordestinos e 21% contavam até com o quinto ano do ensino fundamental incompleto. Expor qualquer pessoa a condições de trabalho análogo ao escravo é crime previsto no Código Penal e a pena se agrava quando o crime é cometido contra criança ou adolescente, ou por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.
Para discutir e saber mais sobre o assunto, o programa Conexões desta segunda-feira, 31, recebeu o professor associado da Faculdade de Direito da UFMG e coordenador da Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas, também da Faculdade de Direito da UFMG, o juiz federal Carlos Henrique Borlido Haddad. O docente explicou as diferenças entre o que é chamado de escravidão contemporânea e a escravização de negros e indígenas que ocorreu no Brasil nos tempos coloniais e imperiais. A delimitação das características que definem uma situação de trabalho como análoga à escravidão, porém, ainda é objeto de muita discussão.
Apesar de variações, geralmente são trabalhos que não têm instalações sanitárias, alojamentos e alimentação adequada. O juiz também comentou sobre as características demográficas das pessoas resgatadas de situações como essas, fazendo uma relação entre essa demografia e o índice de desenvolvimento das regiões de onde saem os maiores números de trabalhadores que são escravizados. “Quanto menos escolarizado, quanto menos oportunidades você vai ter, a tendência é que você se dedique a esse trabalho que se paga muito pouco, as condições são péssimas e que se torna um ciclo vicioso. Precisamos trabalhar essa desigualdade social se a gente quiser melhorar um pouco esse cenário”, defendeu Haddad.
O entrevistado destacou que, muitas vezes, as iniciativas de acolhimento, que oferecem qualificação profissional após o resgate, são muito pontuais. Dessa forma, os trabalhadores acabam se reinserindo em atividades análogas à escravidão.
Ouça a entrevista completa no Soundcloud.
As denúncias de trabalho análogo à escravidão podem ser feitas pelo Disque 100 ou pelo canal online da Divisão de Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério da Economia. A Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas, ligado à Faculdade de Direito da UFMG, também recebe denúncias e presta serviço de ajuda às vítimas.
Produção: Carlos Ortega, sob orientação de Luiza Glória
Publicação: Enaile Almeida, sob orientação de Luíza Glória