A austeridade de um auditório grande e espaçoso foi substituída pelo aconchego de um jardim ensolarado no primeiro dia de Festival de Inverno da UFMG. Ao som dos sinos e dos pássaros da cidade histórica, a mesa de abertura do evento foi realizada na tarde desta quinta-feira, 11, no quintal da casa que abriga o reformulado Centro de Estudos e Biblioteca do Campus Cultural UFMG em Tiradentes, espaço vizinho ao Museu Casa Padre Toledo. 

“É importante procurar o drama humano na Inconfidência Mineira”, defendeu a historiadora e professora da Faculdade de Educação da UFMG Thais Fonseca, participante da mesa sobre os 230 anos da Inconfidência Mineira. “Isso significa olhar a Inconfidência sob outro ponto de vista. Não como episódio histórico povoado de heroísmo e de um patriotismo precursor, como propuseram alguns, nem apenas como um conjunto de reuniões realizadas por uma elite econômica, política e intelectual que não resultaram em nada”, defendeu. 

A professora analisa, sobretudo, o modo como a Inconfidência influenciou a vida e o cotidiano dos habitantes da então vila de São José del-Rei, hoje Tiradentes, tentando projetar o envolvimento e as motivações daqueles que fizeram parte do movimento. “A Inconfidência não chegou a ser uma rebelião, mas foi uma conspiração, um episódio histórico de grande relevância. Para muitos, constituiu um movimento de independência de Minas Gerais, que foi usado como símbolo de um processo de independência do Brasil durante bastante tempo”, ela comentou.

O movimento, também conhecido como Conjuração Mineira, nasceu justamente na região que hoje abriga a cidade de Tiradentes, espalhando-se por outras vilas da então capitania de Minas Gerais. Essa história é contada em profundidade no Museu Casa Padre Toledo, que reabre as portas nesta sexta-feira, 12 de julho, com uma nova exposição permanente.

Também participaram da mesa de debate o professor José Newton Coelho Meneses, diretor do Centro de Estudos Mineiros da Fafich, e Christianni Cardoso Morais, professora do Departamento das Ciências da Educação da Universidade Federal de São João del-Rei. O primeiro discutiu a questão do patrimônio de espaços e cidades, em diálogo com o tema do 51º Festival de Inverno da UFMG, Memória: arte e patrimônio. Christianni Morais, por sua vez, discorreu sobre a circulação das ideias no período, por meio da análise do inventário das bibliotecas dos inconfidentes. 

Acervo reforçado
A mesa de debate foi uma das atividades que marcaram a reinauguração do Centro de Estudos e Biblioteca do Campus Cultural UFMG em Tiradentes, que apresenta novo e ampliado catálogo. 

As estantes cheias e já organizadas do espaço são fruto da doação de acervos particulares de cinco intelectuais brasileiros: o poeta e especialista do barroco mineiro Affonso Ávila, a pesquisadora e colecionadora de arte sacra Márcia de Moura Castro, a antropóloga Mari Baiocchi, pioneira nos estudos indígenas e quilombolas, a professora Melânia Silva de Aguiar e Miguel Lins, cuja coleção já integrava o antigo acervo. 

Como relata a diretora do Campus Cultural UFMG em Tiradentes, Verona Segantini, o Centro de Estudos e Biblioteca oferece nova perspectiva para o Festival de Inverno da UFMG ao mesmo tempo que é impulsionado pelo evento. “Tendo em vista o que aconteceu no Museu Nacional [destruído após um incêndio em setembro de 2018], é importante registrar que, no último ano, a UFMG tem-se dedicado muito à discussão sobre patrimônio e memória”, afirma.

O professor Fernando Mencarelli, diretor de Ação Cultural da UFMG, ressalta que o Centro de Estudos tem como vocação criar um elo entre a Universidade e a cidade de Tiradentes, contribuindo para a discussão de temas relevantes para a área. “Pretendemos envolver não só os temas do patrimônio, do barroco e da arte, mas chegar a questões do meio ambiente, do desenvolvimento sustentável e do turismo, que impactam muito a cidade de Tiradentes.” 

Além dos acervos dos cinco intelectuais, o Centro de Estudos e Biblioteca reúne inventário composto de cerca de 200 mil microfilmes com documentos, cartas e relatórios do Brasil imperial – provenientes do acervo da Torre do Tombo, em Lisboa, e de arquivos de Paris. Todo esse material, de livre acesso, poderá ser consultado no local.

Espírito itinerante
Nesta edição, o Festival de Inverno da UFMG retoma seu espírito itinerante e ocupa seis espaços culturais da UFMG: três no Campus Cultural em Tiradentes e três na região central de Belo Horizonte. Os eventos – exposições, espetáculos teatrais e shows musicais – serão realizados na cidade histórica até amanhã, 13. A programação está disponível no site do evento.