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'Diferença é virtude', afirma Denise Morado em aula magna

Em atividade da recepção de calouros, professora da Escola de Arquitetura discorreu sobre a desigualdade nas cidades

Denise Morando e Sandra Goulart falaram aos calouros no auditório do CAD 1.
Denise Morado e Sandra Goulart  Almeida falaram aos calouros no auditório do CAD 1Foca Lisboa / UFMG

A universidade como “espaço da experiência nas diferenças” foi o tema da aula magna ministrada na manhã desta quinta-feira, 1º, para os calouros do semestre de 2018, na abertura da programação de recepção aos calouros. Em sua conferência, a professora da Escola de Arquitetura Denise Morado lembrou que a sociedade tem ampliado as suas categorias de discriminação e alimentado valores de repúdio ao que é diferente.

“A diversidade social, econômica e espacial passou a ser tratada como um problema. Paralelamente, perdemos a nossa capacidade de fazer perguntas. Nesses moldes, governantes, políticos e intelectuais são incapazes de encontrar ou propor alguma saída. Estamos vivendo uma sociedade doente”, afirmou ela, referindo-se à “cultura do ódio” que tem se disseminado nas vidas real e virtual.

Apesar desse cenário sombrio, a professora fez questão de enfatizar a possibilidade e necessidade de que as pessoas não se submetam a esse cenário, resgatando a capacidade de perguntar, de entrar em contato com o diferente, de ouvi-lo, aceitá-lo, se interessar e aprender com ele. “Antes que eu traga todos vocês juntos comigo nessa tristeza, vamos reconhecer o que está fora do lugar. Temos de transformar o nosso modo de pensar e de fazer. Nosso país é marcado por processos de exclusão espacial, econômica e social. Diversos dados comprovam as origens da desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres, no que se refere à distribuição de serviços e recursos públicos de saúde, educação e segurança. As cidades não são pobres, mas desiguais, social e espacialmente”, disse.

Denise Morando
Denise Morado: imaginação radicalFoca Lisboa / UFMG

Denise Morado recorreu a números para ilustrar essa desigualdade. “Cerca de 70% dos municípios brasileiros não têm tratamento de esgoto, 35 milhões de brasileiros não têm acesso a rede de água tratada, e 92% da população brasileira ganha menos que o auxílio-moradia de um juiz. A renda média nacional dos homens é de R$ 2.251, enquanto a das mulheres é de R$ 1.762. Quase 30% da renda gerada no país está nas mãos de apenas 1% dos habitantes", contrapôs.

A professora também demonstrou como essa desigualdade é perpetuada. “O salário mínimo de 2018 sofreu o menor reajuste em 24 anos. O piso salarial do professor da educação básica da rede pública é de R$ 2.298,80. A cada cem pessoas assassinadas no Brasil, 71 são negras. Uma pessoa é assassinada no Brasil a cada 27 horas em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero. O país ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de nações que mais matam travestis, transexuais e pessoas trans”, listou.

Para superar esse cenário, Denise Morado disse que é precioso agir em consonância com a ideia de “imaginação radical”, proposta pelo filósofo grego Cornelius Castoriádis (1922-1997), ou seja, uma imaginação “nascida da força individual e coletiva”. “Diante da coleção de crises que vivemos, desde o colapso ecológico, passando pela fome, pelo desemprego, até os pesadelos humanitários em cidades, estou invocando em vocês a urgência de uma imaginação radical. Essa parece ser a essência de uma outra lógica do pensar e do fazer. As diferenças precisam ser escutadas, a fim de alimentar radicalmente nossas forças criativas e inventivas. Nossas diferenças não são problemas, mas virtudes. Precisamos dar lugar a projetos utópicos”, afirmou.

Ao fim da aula de Denise, os calouros assistiram a uma apresentação do Grupo de Percussão da UFMG, que é coordenado pelos professores Fernando Rocha e Fernando Chaib, da Escola de Música. 

Sandra Goulart Almeida
Sandra Goulart Almeida: vários percursos possíveis 
Foca Lisboa / UFMG

Viver e ser UFMG
Na abertura da recepção, a vice-reitora e reitora eleita para a gestão 2018-2022, Sandra Goulart Almeida, lembrou aos alunos que são múltiplas as formas de viver a UFMG. “Aqui, há várias trajetórias e percursos possíveis, mesmo dentro do seu próprio curso. Essa é a riqueza da Universidade. Portanto, não fiquem apenas no percurso curricular previsto. Ao longo de sua trajetória, cada um vai construir a sua ‘colcha de retalhos’ (formada pela diversidade de experiências vividas) da maneira que avaliar que é importante para si. O que queremos é que vocês de fato ‘vivam’ a UFMG, e não apenas façam o curso de vocês”, conclamou a vice-reitora.

“A nossa esperança é que cada um de vocês saia daqui como cidadãos mais conscientes do papel que devem assumir na construção de um país mais justo e mais equânime. Isso faz parte do que é ser UFMG”, finalizou a vice-reitora.

À noite, às 19h, a professora da Faculdade de Educação Nilma Lino Gomes ministra nova aula magna, dessa vez centrada na relação entre o conhecimento e a diversidade. A atividade será no auditório do Centro de Atividades Didáticas de Ciências Humanas (CAD 1), no campus Pampulha, aberta também para quem assistiu à primeira aula.

A TV UFMG também acompanhou a recepção na manhã desta quinta-feira:

 

Ewerton Martins Ribeiro