Equipamento fornece dados biomecânicos durante exercício de alongamento
Dispositivo desenvolvido na UFMG mede resistência do músculo e amplitude do movimento, entre outros indicadores
Voltado para a manutenção e melhora da flexibilidade, o alongamento é um tipo de exercício muito comum em atividades físicas, esportivas e em programas de reabilitação fisioterapêutica. Durante o alongamento, ocorre uma deformação das fibras musculares, resultando em aumento do comprimento e alterações nas propriedades biomecânicas do músculo alongado. Com o objetivo de entender o comportamento da unidade músculo-tendão durante a atividade, um grupo de pesquisadores do Departamento de Esportes da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO) desenvolveu aparelho que registra parâmetros do comportamento dos músculos posteriores da coxa.
O dispositivo possibilita mensurar a resistência do músculo ao alongamento, a amplitude de movimento (ADM) durante a extensão passiva do joelho e a primeira sensação de alongamento (PSDA), além de fornecer indicadores associados à resposta biomecânica do corpo, como a variação de amplitude de movimento e do torque passivo, que representa a resistência do músculo à deformação. Outro registro feito pelo aparelho refere-se à atividade eletromiográfica (ativação do músculo). Por fim, o dispositivo favorece a sinalização da percepção de desconforto e dor.
Todos esses parâmetros são obtidos por meio de sensores acoplados nos pacientes examinados. Os dados são enviados a um software, que faz o seu registro e análise, gerando um relatório detalhado e individualizado da resposta dos músculos posteriores da coxa. Segundo o professor do Departamento de Esportes, Mauro Chagas, o equipamento aumenta a quantidade de informações disponíveis sobre o alongamento muscular.
“Quanto mais informações temos a respeito de um fenômeno, mais adequada e individualizada será a proposição de uma possível intervenção. Esses dados aumentam a qualidade na prescrição de exercícios e a capacidade de individualizar os treinamentos e os tratamentos indicados por educadores físicos, fisioterapeutas e médicos. O equipamento traz muitos benefícios relacionados ao treinamento e à recuperação muscular”, explica.
A pesquisa que culminou na criação do equipamento foi descrita na dissertação de mestrado Comparação do efeito agudo do alongamento dos músculos posteriores da coxa nas variáveis biomecânicas e na primeira sensação de alongamento em adultos jovens treinados e não treinados em flexibilidade, de autoria da pesquisadora Barbara Pessali Marques e defendida em 2015.
Bárbara, que também é bailarina, está fazendo seu doutorado na Inglaterra, na Manchester Metropolitan University, onde continua pesquisando o comportamento muscular durante exercícios de alongamento, tão comuns na prática do balé. “A Inglaterra é referência nas ciências da dança, área ainda pouco estudada no Brasil. Esse campo é fundamental para garantir a saúde dos bailarinos, além de constituir novo nicho de atuação para pesquisadores”, conta.
A autora da dissertação conta que a ideia do estudo surgiu porque, durante sua formação de bailarina, ela encontrou muitas barreiras físicas que seus professores não sabiam como enfrentar. Barbara então decidiu cursar graduação em Educação Física para entender melhor como seu corpo reagia durante os exercícios de dança. “Durante a graduação, percebi que a literatura científica sobre preparação física para bailarinos era quase inexistente. Decidi que a melhor forma de obter as respostas que eu tanto queria era estudando o tema. Eu pesquisava e testava os exercícios, buscando compreender por que o corpo dos bailarinos funcionava de forma diferente.”
Bailarinos em teste
O equipamento foi testado em 46 pessoas. Metade desse grupo era formada por bailarinos profissionais, que têm mais capacidade de alongamento muscular. Os outros 23 voluntários eram pessoas sem hábito de realizar qualquer tipo de alongamento. A escolha do músculo posterior da coxa deu-se, segundo Chagas, porque “essa musculatura é muito demandada em vários esportes, além de estar associada à alta incidência de lesões.”
Os testes comprovaram que os músculos se comportam de maneira diferente nos dois grupos. “Os dançarinos têm uma musculatura mais complacente, ou seja, apresentam maior capacidade de deformação quando uma mesma força é utilizada para alongá-la”, conta o professor Chagas.
O professor acrescenta que outro resultado observado está associado à tolerância ao alongamento, ou seja, à percepção subjetiva de desconforto e de dor durante o exercício físico. Os bailarinos acusam a primeira sensação de alongamento, dor e desconforto mais tardiamente se comparados a não bailarinos. “Os movimentos e os testes clínicos para observar o comportamento dessa musculatura já existiam, mas nosso equipamento conseguiu fornecer informações adicionais e mais objetivas, facilitando assim uma padronização do processo. Alguns dos resultados relatados já eram esperados, mas, até então, tínhamos pouca informação concreta sobre o assunto", explica o professor do Departamento de Esportes.
A patente do equipamento já foi registrada, mas o dispositivo ainda precisa passar por ajustes. “Queremos simplificar o processo para que uma pessoa seja capaz de manusear o equipamento sozinha, o que ainda não é possível. Estamos em busca de parcerias para tornar o equipamento mais comercial”, conclui Mauro Chagas.