HC acompanha primeiro bebê com doença rara detectada após ampliação do teste do pezinho
Iniciado nos primeiros dias de vida, tratamento da AME aumenta chances de desenvolvimento típico e sem sequelas
O Hospital das Clínicas (HC) da UFMG realizou, neste mês, o primeiro atendimento de um recém-nascido diagnosticado com Atrofia Muscular Espinhal (AME), uma das três doenças incluídas, neste ano, no programa de triagem neonatal. A ampliação do número de doenças detectáveis pelo teste do pezinho – de 12 para 15 – ocorreu no fim de janeiro, com a inclusão, também, da imunodeficiência combinada grave e da agamaglobulinemia.
O atendimento feito pelo HC, uma das unidades que integra a Rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), ocorreu em 8 de fevereiro, e assistiu uma recém-nascida de Divinópolis, na região Centro-oeste de Minas Gerais. A criança fez o teste do pezinho em uma unidade básica de saúde do município, e o material coletado foi encaminhado ao Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad), órgão da Faculdade de Medicina da UFMG que é referência em triagem neonatal no estado de Minas Gerais. Após detecção da AME, a equipe do Nupad acionou a Secretaria de Saúde de Minas Gerais, entidade responsável por organizar o sistema de regulação para o atendimento especializado e o deslocamento da família.
A assistência e a orientação, em casos de diagnóstico de AME, são prestadas no Ambulatório de Doenças Raras do HC. No espaço, a recém-nascida e seus familiares foram assistidos por uma equipe multidisciplinar coordenada pela neuropediatra e geneticista do HC Juliana Gurgel, professora da Faculdade de Medicina, e composta de residentes em neuropediatria, fisioterapeutas (motora e respiratória), fonoaudióloga e alunas do Internato. Após exame, a equipe orientou a família e a encaminhou para o início do tratamento com a medicação fornecida no hospital, por meio do Ministério da Saúde e da Secretaria de Saúde de Minas Gerais.
Importância do diagnóstico
A necessidade do diagnóstico precoce para minimizar os danos causados pela AME, doença que pode levar à morte, é enfatizada pela professora Juliana Gurgel. “Idealmente, é importante iniciar o tratamento ainda no primeiro mês da criança; se possível, entre a segunda e a terceira semana de vida. Com isso, a criança poderá ter um desenvolvimento neuropsicomotor típico.” Após a primeira consulta, a criança será acompanhada pela equipe multidisciplinar a cada dois meses.
A partir de agora, segundo Juliana Gurgel, o procedimento é acompanhar o desenvolvimento da criança de acordo com uma escala própria. “Nessa escala, avaliamos o desenvolvimento motor, de deglutição, de linguagem e a respiração”, diz a médica. Sobre a prevenção da AME, ela alerta que a confirmação do diagnóstico é um indício para que os pais possam fazer um “aconselhamento genético como forma de orientação e prevenção de novos casos na família”.
Alívio
Para a família, foi um alívio contar com a assistência especializada e multidisciplinar do HC, após a surpresa inicial com o diagnóstico. “Receber o diagnóstico foi um baque. Nossa primeira atitude foi pesquisar na internet, e só encontramos informações ruins sobre a doença. Ficamos muito assustadas, mas, após a primeira consulta, estamos mais tranquilas. É um alívio saber que a bebê será bem cuidada pela equipe da UFMG”, disse uma tia da recém-nascida, que preferiu não ser identificada.
A familiar destacou, ainda, a importância do teste do pezinho e do acompanhamento multidisciplinar no HC. “Descobrimos isso tudo graças ao teste do pezinho, que, agora, investiga e detecta mais doenças. O atendimento que tivemos no HC foi ótimo: estávamos muito angustiadas, mas fomos tratadas com muito cuidado e, depois dessa consulta e de todas as orientações que recebemos, alimentamos boas expectativas e muita esperança”, analisou.
Teste do pezinho e AME
O teste do pezinho é um exame laboratorial, oferecido gratuitamente pelo SUS, que consiste na coleta de gotas de sangue dos pés de recém-nascidos, realizado preferencialmente entre o terceiro e o quinto dia de vida. O teste tem sido ampliado, de forma escalonada, com a instituição da Lei 14.154, em 2022. Anteriormente, eram detectados seis tipos de doenças. Com a ampliação, poderão ser identificadas mais de 50 enfermidades congênitas.
Em Minas Gerais, a análise dessa triagem é concentrada no Nupad. Desde 2021, o serviço detectava 12 tipos de doenças, e, no final de janeiro deste ano, o número saltou para 15, com a inclusão de Atrofia Muscular Espinhal (AME), imunodeficiência combinada grave e agamaglobulinemia.
De origem genética, a AME é uma doença rara e neurodegenerativa, que, por conta da deficiência de proteína de neurônio motor, localizada na medula espinhal, causa degeneração progressiva da criança, levando ao surgimento de fraqueza e hipotonia muscular, o que resulta na perda do tônus muscular e da capacidade de manter a força de resistência dos músculos. Essa degeneração pode começar muito cedo, algumas vezes ainda no útero.