Justiça Federal manda arquivar inquérito contra professora italiana da UFMG
A Justiça Federal em Belo Horizonte concedeu a ordem de habeas corpus pedida pelo Ministério Público Federal (MPF) e determinou o trancamento e o consequente arquivamento do inquérito policial 310/2016-4, instaurado pela Polícia Federal contra a professora Maria Rosaria Barbato, da Faculdade de Direito da UFMG.
Maria Barbato, de nacionalidade italiana, reside no Brasil há oito anos e é professora concursada da UFMG, onde ministra aulas de Direito do Trabalho e de Introdução ao Estudo do Direito.
No dia 3 de março deste ano, a Polícia Federal em Belo Horizonte instaurou inquérito policial contra ela, a partir de denúncia anônima segundo a qual a professora estaria envolvida com a militância de partidos políticos e participando de atividades partidárias e sindicais, em suposta violação ao Estatuto do Estrangeiro.
Na decisão, o juiz federal Murilo Fernandes de Almeida, titular da 9ª Vara, destacou que "o respeito devido à dignidade de todos os homens não se excepciona pelo fator meramente circunstancial da nacionalidade. Sequer os estrangeiros, em trânsito na nossa pátria, estão excluídos de tal tratamento".
Ainda de acordo com a sentença, “o pluralismo político assegura ao indivíduo a liberdade para se autodeterminar e levar a sua vida como bem lhe aprouver, imune à intromissão de terceiros, sejam elas provenientes do Estado ou mesmo de particulares. Assim, embora a Constituição brasileira utilize a expressão pluralismo, agregando-lhe o adjetivo político, o que, à primeira vista, poderia sugerir tratar-se de um fundamento que se refere apenas a questões políticas ou ideológicas, certo é que sua abrangência é muito maior, significando pluralismo na polis, ou seja, um direito fundamental à diferença em todos os âmbitos e expressões da convivência humana”.
Também pesou na decisão do magistrado o fato de o inquérito policial ter sido instaurado a partir de representação anônima, de "forma manifestamente abusiva" e "claramente contrário à ordem jurídica, que veda expressamente o anonimato porque, além de ofender a dignidade da pessoa humana, permite, ainda, a prática do denuncismo inescrupuloso".
Por fim, o juiz federal, considerando atípicas as condutas imputadas à professora, "vez que os artigos mencionados na Lei 6.815/80, como se demonstrou, não foram recepcionados pela CF/88", justificou ser "evidente a ausência de justa causa para a continuidade das investigações e possível instauração de ação penal".
Direitos fundamentais
Ao impetrar o habeas corpus, o MPF sustentou que a investigação contrariava direitos fundamentais, configurando "ato ilegal, carente de justa causa, com potencial de causar injusto constrangimento à liberdade de locomoção da paciente", em especial porque o artigo 5º da Constituição assegura isonomia de tratamento entre brasileiros e estrangeiros residentes no país.
Para o MPF, as vedações impostas pelo Estatuto do Estrangeiro não foram acolhidas pela Constituição de 1988, tendo em vista que, além dos direitos previstos no artigo 5º, também direitos sociais, como os trabalhistas e a liberdade sindical, são assegurados aos estrangeiros residentes no país.
O habeas corpus impetrado pelo MPF se fundamentou, ainda, no art. 3º, inciso IV, da Constituição, que enuncia, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, bem como no art. 8º do texto constitucional, que assegura a liberdade de associação profissional ou sindical.
Leia mais sobre o caso
Reitor e vice-reitora reúnem-se com professores e reafirmam necessidade de defesa da democracia