Memórias 'eternizam' o conhecimento, defendem participantes de roda de conversa
Importância do registro material e virtual foi abordada no quarto dia de realização do 17º Festival de Verão
Lembranças de edições anteriores dos festivais de Verão e Inverno da UFMG e a importância da criação de espaços para guardar e eternizar as produções artísticas e o conhecimento produzido nesses eventos foram os temas abordados na mesa-redonda Cultura e memória: conversas e registros – cultura e conhecimento, que ocorreu nesta quinta-feira, dia 2, no Conservatório UFMG, como parte da programação do 17º Festival de Verão UFMG.
Ana Gomes, professora da Faculdade de Educação (Fae) da UFMG, abriu a conversa afirmando que uma das violências praticadas no Brasil é o impedimento de que as memórias se transformem em histórias. Para exemplificar esse impedimento, a professora contou que fez parte de uma banca de defesa de doutorado em que o estudante havia ido para a China e se impressionado com o fato de que os chineses conhecem a fundo suas ancestralidades.
“Há países onde as pessoas valorizam as suas histórias e conhecem as suas origens. Lidar com a memória no Brasil é lidar com o desconhecimento da nossa ancestralidade, e o impedimento dessa memória pode gerar o deslocamento de nossas identidades”, disse.
A professora acrescentou que o impedimento à memória pode estar relacionado à ignorância do campo humanístico. Segundo ela, as pessoas precisam ter oportunidades de adentrar e conhecer as áreas linguística e humanística, porque elas estão relacionadas à preservação das histórias. “Quando o ensino médio, na década de 80, se tornou ‘científico’, foi uma espécie de recusa à formação humanística, tão importante para que valorizemos a memória, a diversidade e a cultura. A cultura está relacionada à luta pela existência de um povo que tem sua presença e memória silenciadas.”
Dança e liberdade
A poeta e professora aposentada da Faculdade de Letras (Fale) da UFMG Sônia Queiroz e o bailarino e professor dos cursos de Teatro e Dança da Escola de Belas Artes (Eba) da UFMG Arnaldo Alvarenga se emocionaram ao relembrar vivências relacionadas à Universidade.
Alvarenga contou que se mudar do interior de Minas Gerais para Belo Horizonte na infância foi uma experiência que o impactou: ele estava acostumado a viver livre e subir em pés de manga e jabuticaba na casa onde vivia no interior, enquanto, na capital, sentia-se preso e sem espaço para dar vazão à sua vontade de dançar. “Mas isso mudou quando tive a oportunidade de estudar dança no Colégio Arnaldo. A dança apareceu, assumiu um lugar na minha vida e me ensinou a lidar com o meu corpo”, desabafou.
Ele contou que os festivais da UFMG permeiam sua memória com lembranças que o levaram a se tornar o bailarino que ele é hoje. “Lembro-me de apresentações memoráveis a que assisti nos festivais da Universidade e acho importante que haja registros de todos esses momentos, pois o que não está registrado não existe.”
A professora Sônia Queiroz corroborou com a ideia de que o registro está associado à existência da memória e à eternização do conhecimento ao relembrar uma de suas primeiras ações em um festival da UFMG quando o evento ainda ocorria em Diamantina.
“Realizamos um trabalho bem-sucedido de resgate do acervo do fotógrafo Chichico Alckmin, que hoje está disponível no Instituto Moreira Salles, em São Paulo. O resgate histórico é importante porque disponibiliza materiais que poderiam ficar escondidos das pessoas”, argumentou.
A professora acrescentou que os festivais e as ações culturais da Universidade produzem conhecimento, o que vai ao encontro da atividade da UFMG como instituição de pesquisa. “Resgatar a memória é produzir conhecimento. O registro precisa ser feito de forma material e virtual, para que o conhecimento passe para as próximas gerações. Devemos criar espaços para que as memórias não se percam”, concluiu.