‘Minas são muitas’: distribuição de variantes do Sars-CoV-2 pelo estado é heterogênea
Estudo da UFMG revela que a versão gama (P.1) predomina, mas com grande diferença de presença entre as regiões Norte e Triângulo
Pesquisa coordenada pelo Laboratório de Biologia Integrativa do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG produziu um panorama das variantes do Sars-CoV-2 mais presentes em Minas Gerais. O estudo, considerado o mais abrangente desse tipo já realizado no estado, analisou 1.198 restos de amostras coletadas para exames de PCR em 282 municípios mineiros. Elas são representativas das 28 Unidades Regionais de Saúde (URS).
As análises, que tiveram início em março deste ano, mostraram que a variante gama (anteriormente chamada de P.1 e de variante de Manaus) é a mais presente em Minas Gerais, sendo encontrada em 74,12% das amostras analisadas. Essa variante também foi observada em 100% das amostras coletadas nas URSs dos municípios de Patos de Minas e Uberlândia.
“Queríamos uma fotografia fiel das variantes da covid-19 que circulam em Minas Gerais. A covid-19 é uma doença infecciosa transmitida pela interação e pelo contato sociais, e esse tipo de estudo mostra os padrões de deslocamento de bens, serviços e pessoas, favorecendo a observação da progressão das variantes nas diversas regiões de Minas Gerais”, explica Renan Pedra de Souza, professor do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do ICB e um dos coordenadores da pesquisa, juntamente com o colega de departamento Renato Santana de Aguiar.
As análises também mostraram que Téofilo Otoni e Pedra Azul foram as URSs com menores frequências da variante gama, com 23,68% e 30,30%, respectivamente. Ao fim do estudo, os pesquisadores constataram que as variantes alfa (B.1.1.7, identificada pela primeira vez no Reino Unido) e gama (P.1), juntamente com a variante zeta (P.2, identificada inicialmente no Rio de Janeiro), respondem por quase 98% das amostras analisadas. Todas elas apresentam maior infectividade quando comparadas às linhagens presentes no Brasil no primeiro semestre do ano passado. Já a variante delta, registrada pela primeira vez na Índia, neste ano, não foi encontrada nas amostras mineiras.
Informação estratégica
Apesar de três em cada quatro amostras encontradas no estado serem da variante gama (P.1), Souza destaca que isso não quer dizer que ela está igualmente distribuída em Minas Gerais. “Nosso estado é heterogêneo. No Triângulo Mineiro e no Alto Paranaíba, por exemplo, 100% das amostras eram dessa variante, mas, em outras regiões do estado, outras variantes foram predominantes”, diz.
O pesquisador acrescenta que identificar a variante hegemônica em determinada região do estado é essencial para a elaboração das políticas públicas de combate à pandemia. “É uma informação estratégica de saúde que possibilita que o governo planeje a distribuição de oxigênio, de leitos e de capital humano, por exemplo. Se a variante delta chegar a Belo Horizonte, por hipótese, teremos mais condições de prever sua dispersão, visto que já conhecemos os padrões de deslocamento nas diversas regiões", afirma Renan Souza.
Ainda de acordo com o professor, à medida que algumas variantes aumentaram sua frequência ao longo tempo, foram observadas alterações no perfil dos pacientes que manifestavam sintomas e eram internados. “Novas variantes podem configurar perfis de paciente diferentes. Esse tipo de informação também é importante para o planejamento da saúde pública. Enquanto a P.1 provoca internações de pessoas mais jovens e por mais tempo, a P.2 cria menos complicações. É importante evitar que as variantes mais complicadas cheguem a regiões com menos estrutura de atendimento em saúde”, conclui.
Vigilância genômica
O estudo, que foi coordenado pelo ICB, reuniu outros laboratórios da UFMG, a Fundação Ezequiel Dias, a Secretaria de Saúde de Minas Gerais, a Prefeitura de Belo Horizonte e as universidades Federal de Viçosa (UFV) e dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM).
Além de desenvolver estudos sobre a presença de variantes do coronavírus em Minas Gerais, a UFMG mantém, em parceria com a PBH, o Observatório de Vigilância Genômica para receber amostras semanalmente e caracterizá-las em até 10 dias. “Essa iniciativa, que já existe em outras capitais brasileiras, vai possibilitar a geração mais rápida de informações. As amostras do nosso último estudo foram coletadas no início deste ano, então os dados que acabamos de divulgar mostram uma pandemia do passado. É essencial que tenhamos informações mais atualizadas, referentes aos meses correntes. Quando dispõe de dados concretos e em tempo real, a vigilância epidemiológica possibilita tomada de decisões mais ágil”, conclui Renan Pedra de Souza.