Popularizados durante a pandemia, QR Codes são fruto de estudos científicos
Pesquisadora da UFMG explica como os códigos de barras bidimensionais funcionam nos celulares
Até o início das lives artísticas com códigos na tela destinados à doação de alimentos e outros itens a pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica, durante o período mais duro de restrições sociais e sanitárias impostas pela pandemia de covid-19, em 2020, o uso de QR Codes (Quick Response Codes – códigos de resposta rápida), não era tão popular no Brasil quanto hoje.
Na tentativa de diminuir o compartilhamento de várias páginas de cardápios impressos, que, em pouco tempo, ficavam sujos, devido ao manuseio constante, diversos bares e restaurantes substituíram os menus analógicos por adesivos com QR Codes, acessíveis por meio dos celulares. A “novidade” fez com que grande parte das pessoas tivesse dificuldades para se adaptar à tecnologia e outra parte, ainda hoje, tivesse que ajudar aos amigos ou familiares a escanear e a abrir um QR Code, para, por exemplo, acessar aplicativos bancários ou consultar sites em cartazes espalhados pelas cidades.
Como um link se transforma em uma imagem e abre na tela do celular das pessoas? O que pode parecer “mágica” é fruto de estudos científicos do campo da ciência da computação, materializados em tecnologia nos anos 1990. De acordo com a mestranda do Programa de Pós-graduação em Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisadora do Wireless Networks Lab – UFMG (WINET – Laboratório de Redes sem fio) Júnia Oliveira, “os QR Codes foram desenvolvidos em 1994 pela empresa Denso Wave, subsidiária da Toyota, no Japão, inicialmente, para rastreamento de peças em manufatura. Eles são amplamente utilizados devido à facilidade de acesso a diversas aplicações, como pagamentos, publicidade, redes sociais e informações diversas. Para ler a informação, basta apontar a câmera do smartphone para o QR code e clicar no link que aparece. Neste momento, o usuário será direcionado ao conteúdo vinculado”.
Atualmente, os QR Codes costumam direcionar para links, vCards (informações de contato), eventos de calendário, informações de Wi-Fi, entre outros. Detalhando o processo de transformação de um link em um QR Code, Junia explica como o processo acontece: “o link que desejamos atribuir ao QR code passa por um processo de codificação. A codificação é uma operação que atribui valor de símbolos ou caracteres a uma mensagem que poderá ser interpretada e compreendida por dispositivos, pessoas ou entidades que compartilham do mesmo código, símbolo ou caractere. A codificação tem o objetivo de deixar a mensagem secreta ou ilegível a quem não deve ter acesso. No caso do QR code, a codificação é realizada por algoritmos elaborados para tal fim. Algoritmo é uma sequência finita de ações executáveis para obtenção de uma solução para determinado tipo de problema. Cada sistema de um fornecedor de QR code tem o seu algoritmo próprio”.
A mestranda elenca cinco fases que envolvem o processo de leitura de um QR Code pelo celular:
- captura da imagem – a câmera do celular captura uma imagem da matriz bidimensional do QR Code;
- decodificação da imagem – o software do celular processa a imagem capturada e identifica os padrões de módulos pretos e brancos;
- identificação do padrão do posicionamento – o software localiza os padrões de posicionamento que cercam o QR Code, permitindo que ele determine a orientação e a escala do código;
- extração dos dados – o padrão de módulos é dividido em blocos de dados, e o software extrai os bits (é a menor unidade de informação que pode ser armazenada ou transmitida) de informação desses blocos, desconsiderando as áreas de correção de erro;
- decodificação dos dados – os bits extraídos são decodificados de acordo com o esquema de codificação usado para gerar o QR Code original. O processo de decodificação resulta nos dados brutos, que podem ser um URL (Uniform Resource Locator, o Localizador Uniforme de Recursos, endereço eletrônico que permite acesso aos sites) ou outros tipos de informações. Se os dados decodificados correspondem a um URL, o software do celular oferece a opção de abri-la em um navegador da web ou em um aplicativo apropriado.
Acessibilidade
Segundo a professora Sônia Pessoa, da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG e coordenadora do Afetos: Grupo de pesquisa em comunicação, acessibilidade e vulnerabilidade – UFMG, o uso de QR Code tem o potencial de beneficiar tanto as pessoas com deficiências (PCDs) quanto as pessoas idosas ou com necessidades específicas. Ela exemplifica: “A câmera do celular faz a leitura desse código binário e abre automaticamente uma informação que pode ser em áudio. No caso de pessoas com deficiência visual, é importante que seja feita em audiodescrição, possibilitando o acesso aos detalhes que a ausência de uma informação sonora implicaria. Ao acessar uma caixa de medicamento em uma farmácia, a pessoa com deficiência visual depende que outra pessoa leia para ela o que está escrito na caixa. A cor da tarja, qual grupo de remédios aquele aquela medicação pertence? Qual é o princípio ativo? Se há algum alerta sobre alergias. Estou dando o exemplo de uma medicação em uma farmácia, porque muitas vezes é algo que pode provocar danos à saúde da pessoa caso ela não tenha um apoio ou a colaboração de uma outra”. A professora complementa a avaliação sobre o potencial dos QR Codes ao classificá-lo como uma tecnologia assistiva, ou seja, que colabora para a acessibilidade das pessoas com deficiência.
Sônia Pessoa também inclui as pessoas idosas como beneficiadas pelos QR Codes. De acordo com a professora, os códigos podem permitir o acesso ao detalhamento de informações, em diversas situações, proporcionando mais autonomia cotidiana: “Ao acessar o QR Code com a câmera do celular e acessar uma descrição em áudio, por exemplo, a pessoa terá acesso ao tamanho da roupa, as medidas, as cores, ao formato. A tecnologia assistiva tem um objetivo e trabalha sempre em busca de acesso. Garantir o acesso efetivamente e, consequentemente, a autonomia”.
Segurança
Apesar dos diversos benefícios dos QR Codes, a pesquisadora do WINET Junia Oliveira faz um alerta: como qualquer meio de comunicação digital, os QR Codes podem ser explorados para redirecionar conteúdo malicioso. Por isso, é preciso ter cuidado, em meio à forte popularização do uso de QR Codes e não escanear qualquer código ou abrir qualquer link por meio do celular. “Por essa facilidade é muito importante saber a origem do QR code, pois a leitura indevida de um QR code malicioso pode fazer com que o smartphone fique vulnerável a ataques cibernéticos que danificam e roubam informações importantes contidas no aparelho", alerta. Conferir a origem dos códigos e usar aplicativos antivírus são estratégias que auxiliam a diminuição de possíveis problemas.
Intermídias
A reportagem sobre o funcionamento dos QR Codes, além da versão em texto, no Portal UFMG, teve também uma versão sonora, veiculada pela Rádio UFMG Educativa e uma versão audiovisual, divulgada pelo perfil da Universidade no Instagram.