Espetáculo inspirado em conto de Tchekhov será encenado na noite de hoje
Conferência de Grace Passô e performance de Priscila Rezende completam programação do dia do Festival de Inverno, no Conservatório UFMG
A programação desta terça-feira, 24, do 50º Festival de Inverno da UFMG será intensa no Conservatório UFMG – a começar pela performance Reeducação, que será realizada às 15h pela artista Priscila Rezende, no pátio externo. Em seguida, às 19h, a premiada atriz e dramaturga Grace Passô ministra uma conferência no auditório da unidade.
Às 21h, fechando a programação do dia, o ator, diretor e pedagogo de teatro François Kahn apresenta o espetáculo A dama do cachorrinho, baseado em um conto homônimo do escritor russo Anton Tchekhov (1860-1904). O Conservatório UFMG fica na Avenida Afonso Pena, 1.534, Centro.
A excelência da atuação
Em Conversando com Grace Passô, a premiada atriz, diretora e dramaturga de Belo Horizonte apresentará um panorama de sua trajetória e de seu trabalho, tomando como pano de fundo o tema – coexistência – e a história do Festival de Inverno da UFMG.
Com peças traduzidas para seis idiomas, Passô já recebeu os principais prêmios do teatro nacional – Shell, Cesgranrio e APCA – e foi consagrada no ano passado como a melhor atriz do Festival do Rio, em razão de sua atuação no filme Praça Paris. A conversa com Grace é aberta ao público amplo, assim como todas as conferências do Festival.
Dentre os temas abordados pela atriz, é esperado que ela fale sobre o grupo Espanca!, que fundou em 2004, seu trabalho como dramaturga, vertente que resultou em peças como Por Elise, Vaga carne e Mata teu pai, e sua investida no cinema.
Após a conferência, François Kahn apresenta o monólogo A dama do cachorrinho, baseado no famoso e um tanto autobiográfico conto de Tchekhov, escrito no final de sua carreira. No palco, Kahn interpreta um senhor maduro e casado, da alta sociedade moscovita. Em férias solitárias, o personagem se encontra com uma jovem que, assim como ele, está infeliz no casamento.
A classificação etária da peça é 16 anos e a entrada é gratuita, como em toda atividade cultural do Festival de Inverno da UFMG. A limitação de público da sala onde o espetáculo será encenado é de 60 pessoas.
“Quando escolho um texto, eu sei que vou portar esse texto por muitos anos, porque eu gosto de fazer e refazer, retomar o texto várias vezes. Há textos que fiz há 25 anos e que ainda refaço: quando começo a trabalhar, eu espero que seja por muito tempo”, explica François Kahn.
O ator diz só escolher textos que são “como um reflexo da minha vida, das minhas preocupações, do meu modo de sentir e de ver o mundo”: “devo amar realmente o texto”, afirma. “E por isso é muito complicado escolher os textos. Só escolho os que eu verdadeiramente quero ‘defender’. Que é o que aconteceu com este conto", diz, citando Tchekhov. "Quando o reencontrei, muito tempo depois de tê-lo lido, soube que era algo que eu queria fazer”, lembra.
Considerado um dos grandes nomes do teatro contemporâneo, François Kahn é ator, diretor, dramaturgo e pedagogo teatral. Entre 1973 e 1985, foi aluno do diretor polonês Jerzy Grotowski, um dos principais teatrólogos do século 20. No decorrer de sua trajetória, Kahn desenvolveu sua própria linha de trabalho, intitulada Teatro de Câmara, em que busca eliminar as barreiras formais e sociais entre ator e espectador. Hoje, desenvolve atividades na França, na Itália e no Brasil.
O trabalho de Kahn é fortemente atravessado pela literatura, e durante o Festival o ator também está ministrando a residência artística Memórias inventadas: um laboratório teatral sobre a improvisação estruturada, a partir de textos de Manoel de Barros, cujas inscrições já se encerraram. No curso, estudantes e profissionais de teatro estão realizando a composição individual de uma breve cena a partir da improvisação sobre lembranças pessoais, e uma composição de grupo, partindo fragmentos literários.
É preciso reeducar(-se)
Priscila Rezende se graduou em artes plásticas na Escola Guignard, da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), em 2011, e desde 2010 trabalha com performance, tendo se apresentado em cidades como Londres, Nova York e Berlim, além de no Brasil. No início de 2018, realizou residência artística na Central Saint Martins, em Londres, Inglaterra, uma das principais referências no ensino de arte e design no mundo. O trabalho que apresentará no Festival de Inverno, levado a público pela primeira vez em Berlim, Alemanha, em 2016, “é uma reescrita dos mitos cristãos em que fui ensinada a acreditar”, explica a artista.
Na performance, Priscila usa óleo de dendê para escrever em uma bíblia o mito da criação do mundo conforme a cultura iorubá, de matriz africana. Vinda de família evangélica, Priscila conta que, quando criança, foi criada em meio ao racismo e ao preconceito em relação à cultura afro-brasileira e suas religiões. “Ao me aproximar das questões referentes ao racismo, à negritude e à ancestralidade, entendi que as culturas africanas não eram aquilo que me ensinaram quando criança. Então, a ideia do meu trabalho é essa, de fazer uma espécie de reaprendizado”.
Na medida em que a intervenção ocorre sobre as páginas da bíblia, elas vão sendo expostas em um painel. A ação dura em torno de quatro horas e será realizada no pátio externo do Conservatório UFMG, a partir das 15h, até as vésperas da conferência de Grace Passô.