Região Sudeste responde por metade dos transplantes renais em crianças feitos no Brasil
Dados nacionais trabalhados em pesquisa da Faculdade de Medicina possibilitaram o reconhecimento inédito do perfil dos pacientes em terapia renal
Características sociodemográficas, clínicas e epidemiológicas das crianças e adolescentes em terapia renal substitutiva (TRS) no Brasil foram descritas, pela primeira vez, em estudo desenvolvido na UFMG. A pesquisa revela que 50% dos transplantes no Brasil são realizados no Sudeste e em capitais, o que reforça a disparidade entre as regiões do país. Realizado no Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da Criança e do Adolescente, sediado na Faculdade de Medicina, o estudo evidencia diferenças na população estudada, considerando região, sexo, idade e cor da pele. Os dados que subsidiaram o trabalho são da Base Nacional em Terapia Renal Substitutiva, composta dos registros de três grandes sistemas de informações do Sistema Único de Saúde (SUS).
A assistente social Celina Rezende, autora da tese Transplante e óbito em crianças e adolescentes em terapia renal substitutiva no Sistema Único de Saúde, no Brasil, de 2002 a 2014, ressalta que pacientes com doença renal crônica e seus familiares enfrentam várias dificuldades para a realização do tratamento e para a reabilitação. “Foi importante mapear as áreas em que essas crianças faziam o tratamento, para descrever o perfil dessa população, a fim de apresentar dados que pudessem ajudar a pensar em novas políticas públicas de saúde e de assistência destinada a esses indivíduos”, explica.
A pesquisadora destaca ainda que é importante saber quem são esses pacientes e como as políticas públicas podem atendê-los de maneira mais eficaz. “Em razão das dificuldades para o tratamento de diálise, muitos pacientes ainda precisam sair de sua cidade de origem, e até mesmo do estado, em busca de locais onde terão assistência adequada. Pacientes das regiões Norte e Nordeste, por exemplo, muitas vezes precisam se mudar para Belo Horizonte para fazer o tratamento”, exemplifica Celina Rezende.
Tratamentos renais
A doença renal crônica pode ser causada por vários fatores clínicos e afeta a função e a estrutura do rim de modo persistente e progressivo. Em crianças ou adolescentes, essa insuficiência pode ocorrer por conta de complicações no parto, predisposição genética e patologias ocasionadas por diferentes doenças. Quando a doença renal crônica chega ao estágio 5, fase em que os rins já não conseguem fazer a filtração adequada para garantir a sobrevida do paciente, é preciso iniciar a terapia renal substitutiva.
No Brasil, a hemodiálise é o tratamento com o maior número de pacientes pediátricos, e é realizada, em clínicas especializadas, três vezes por semana. Outra modalidade de tratamento renal é a diálise peritoneal, feita na casa do paciente, diariamente, com a ajuda de um familiar.
O estudo identificou que, dos 7.544 pacientes pediátricos presentes na base de dados do Ministério da Saúde, 53,8% são do sexo masculino, e 46,2%, do feminino. Verificou-se também que ocorrem mais mortes em pacientes do sexo feminino. Esse dado, destaca Celina Rezende, é de extrema importância para ajudar no diagnóstico precoce e possibilitar a oferta de intervenções clínicas preventivas, como a correção de anomalias passíveis de solução por meio de cirurgias. Com isso, é possível oferecer ao indivíduo um tratamento adequado, para que não seja necessário recorrer à diálise.
Melhor terapia
O transplante é o melhor tratamento dialítico recomendado para todos os pacientes em terapia renal, porque apresenta maior taxa de sucesso em relação às demais terapias. O procedimento é indicado antes mesmo de haver necessidade de hemodiálise ou diálise peritoneal e pode aumentar significativamente a expectativa de vida desse grupo de pacientes. “A pesquisa ratifica ainda mais a necessidade da doação de órgãos e a importância de se fazer o transplante o quanto antes, para aumentar a expectativa e a qualidade de vida dos pacientes”, argumenta a pesquisadora.
De acordo com Celina Rezende, o estudo também possibilitou perceber que as crianças que conseguem realizar o transplante têm maior longevidade que pacientes que se mantêm em tratamento de hemodiálise e diálise peritoneal. Por isso mesmo, elas são prioridade para o transplante renal. O professor Sérgio Veloso, orientador do estudo, defende que os perfis mapeados sejam utilizados para criar “políticas públicas que atendam à população, de forma equitativa, de todos os grupos étnicos e em todas as regiões do Brasil".