Sequelas neuropsiquiátricas da covid-19 serão avaliadas em estudo
Indivíduos que tiveram manifestações leves ou moderadas podem se candidatar como voluntários da pesquisa conduzida pela Faculdade de Medicina
Pacientes que se infectaram pelos coronavírus causadores, por exemplo, da Síndrome Respiratória do Oriente Médio (Mers) e da Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars) relataram manifestações neuropsicológicas cerca de um a dois anos após a doença. Pouco se sabe ainda sobre o comportamento do SARS-CoV-2 em relação a esse campo da saúde humana, e uma pesquisa que começa a ser desenvolvida pela Faculdade de Medicina da UFMG pretende exatamente avaliar em que medida sequelas do gênero também alcançam pessoas que contraíram a covid-19.
A pesquisa, aprovada em junho deste ano em edital da Capes, já está na fase de recrutamento de pacientes para os testes. Serão selecionadas pessoas acima de 18 anos, que tiveram o exame RT-PCR positivo para a covid-19 e que apresentaram manifestações leves ou moderadas da doença. A partir desse estudo, será possível analisar, por exemplo, se alguns quadros psiquiátricos, como depressão, ansiedade e psicose, podem ter relação com a infecção pelo novo coronavírus.
O ensaio também contará com um grupo controle, com indivíduos que tiveram exame negativo. O acompanhamento de todos os pacientes será feito ao longo de dois anos. A expectativa é recrutar cerca de 300 pessoas nos próximos três meses.
O coordenador da pesquisa e professor do Departamento de Saúde Mental da Faculdade, Marco Aurélio Romano-Silva, ressalta que o objetivo é avaliar os efeitos diretos do vírus. Por isso, não serão recrutados participantes com manifestações muito graves, que ficaram internados em UTIs. “Como foi necessária a ventilação mecânica, eles podem ter tido, por exemplo, hipoxemia (baixo nível de oxigênio nos tecidos) ou outros problemas que tendem a afetar o metabolismo cerebral", justifica o professor.
Recrutamento
Inicialmente, estão sendo convidados pacientes diagnosticados com resultado positivo para covid-19 pelos exames realizados pelo Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad) e encaminhados de hospitais como o Odilon Behrens e o Risoleta Tolentino Neves. Também serão aceitos voluntários que se candidatarem pelo número de WhatsApp e formulário do projeto.
Após o recrutamento, os pacientes farão testes neuropsicológicos e clínicos, exames como ressonância magnética, PET-CT, NIRS e coleta de sangue para perfil sorológico. Esse acompanhamento será feito a cada seis meses, com registro dos sintomas que podem ter surgido nesse período.
Os dois grupos (positivos e negativos) repetirão os exames ao longo dos dois anos. “Nada pode ser descartado, já que, mesmo em pacientes assintomáticos, o vírus pode ter passado para o sistema nervoso central e provocado uma neuroinflamação que não apareceu como sintoma clínico. Isso, no futuro, pode se manifestar como sintoma psiquiátrico e neurológico”, explica Marco Aurélio.
O professor acredita que, após um ano de acompanhamento, já será possível fazer uma análise com resultados suficientes para gerar artigos e resumos. “São oito meses de pandemia. Não temos certeza do que pode acontecer daqui a um ou dois anos. Por isso, tudo que encontrarmos nesse período pode ser importante”, projeta o professor.
Dados escassos
Marco Aurélio Romano acrescenta que, em razão de a doença ser muito recente, os dados da literatura ainda são escassos. “Há hipóteses de que o SARS-CoV-2 possa entrar pelo bulbo olfatório, porque, entre os sintomas da doença, está a anosmia (perda de olfato). Já em relação às infecções provocadas por outros coronavírus, ficou demonstrado que eles podem entrar por via hematogênica e atravessar a barreira hematoencefálica, por estarem circulando no sangue. Há, portanto, muita discussão sobre os sintomas, mas nada ainda muito sistematizado”, pondera.
Como muitas pessoas estão expostas ao vírus, o professor defende a necessidade de analisar as sequelas que essa infecção pode deixar. “Uma gripe, por exemplo, sabemos que vai passar e não vai deixar muitas sequelas. Não é o caso da covid-19. Alguns indivíduos relatam situações de fadiga mesmo depois de recuperados e ficaram três, quatro, cinco meses com esse quadro”, lembra.
Os voluntários que se encaixam no perfil proposto pelo estudo e desejam participar da pesquisa Manifestações e sequelas neuropsiquiátricas da covid-19: aspectos clínicos e moleculares devem entrar em contato pelo WhatsApp do Centro de Tecnologia em Medicina Molecular (CTMM) – (31) 99723-4160 – ou preencher formulário eletrônico.