Professora da Fale analisa o processo de escolha dos imortais da Academia Brasileira de Letras
Myriam Ávila concedeu entrevista ao programa Universo Literário e comentou as críticas e elogios à ABL pelas recentes seleções de seus membros
Fundada em 20 de julho de 1897, a Academia Brasileira de Letras é uma instituição cultural que visa cultivar a língua e a literatura nacionais. Ela é composta de 40 membros, os chamados “imortais”, que após eleitos permanecem vinculados à instituição até o fim da vida. Quando morre um acadêmico, a ABL realiza um processo de despedida, a Sessão da Saudade. Após um período, a vaga é declarada aberta, permitindo a candidatura de aspirantes a integrar o quadro.
Para se inscrever, o candidato tem que ser brasileiro nato e ter um livro escrito em qualquer gênero. As mais recentes votações elegeram a atriz Fernanda Montenegro, o músico Gilberto Gil e o neurocirurgião Paulo Niemeyer Filho ao cargo de membros da ABL. As decisões foram duramente criticadas, haja vista que nenhum dos nomes citados apresentam contribuições significativas à literatura nacional. No caso de Montenegro, por exemplo, a artista possui apenas dois livros publicados, ambos do gênero biográfico e lançados há menos de 5 anos. Por outro lado, também houve elogios ao fato da Academia se mostrar aberta a diferentes tipos de arte.
O processo eleitoral da Academia Brasileira de Letras e a importância da instituição para a literatura nacional foram tema de entrevista no programa Universo Literário desta terça-feira, 23, que recebeu a professora titular de Teoria da Literatura e Literatura Comparada na Faculdade de Letras da UFMG Myriam Ávila. Ela avaliou que, apesar de uma abertura para a eleição de figuras não ligadas à literatura, prevalece nas escolhas o critério da erudição, tanto no âmbito das artes quanto fora dele.
A pesquisadora também comentou sobre a falta de representatividade e diversidade entre os imortais. O cantor Gilberto Gil, eleito este mês, é apenas o terceiro homem negro a ocupar uma cadeira. Mas ela acredita que o cenário tem melhorado, uma vez que a opinião pública expressa, principalmente, pelas redes sociais influencia na escolha dos acadêmicos e projetou que devemos ter um indígena integrando o quadro em breve.
Myriam Ávila é filha do grande escritor e poeta Affonso Ávila e comentou a postura de seu pai em relação à ABL. Ela contou que a resistência tinha relação com a época. Entre os anos 1940 e 1970 havia uma visão de um grupo de escritores que considerava a Academia algo conservador e que fora da instituição se podia fazer literatura com mais liberdade. Affonso fazia parte desse grupo, integrado por nomes como Drummond, que chegou a se comprometer a jamais integrar a ABL.
Durante a entrevista à Rádio UFMG Educativa, a docente explicou os motivos das escolhas de intelectuais de fora da literatura como imortais, que sempre ocorreu. "A literatura não foi um ofício mais espontâneo na formação do Brasil. A imprensa e a publicação de livros era proibida até o país declarar sua independência. Então, muito da cultura era veiculada através da música, rituais, procissões, comemorações. Essa formação cultural do Brasil justifica ou até nos dirige para uma visão mais ampla”. Para a pesquisadora, nos dias atuais, há uma pressão por maior abertura. “As próprias pessoas que estão dentro da Academia estão sentindo, pelo ambiente cultural brasileiro, que eles tem que se abrir. Ou a Academia se abre ou ela morre", comentou.
Ouça a entrevista completa no SoundCloud.
Atualmente, seguem abertos processos para o preenchimento das cadeiras de número 39 e 2. As eleições para a escolha dos novos ocupantes dos assentos serão realizadas nos dias 25 de novembro e 16 de dezembro, respectivamente. Mais informações estão disponíveis no site da ABL.
Produção: Alexandre Miranda e Nicolle Teixeira, sob orientação de Alessandra Dantas e Luíza Glória
Publicação: Carlos Ortega, sob orientação de Alessandra Dantas