Razão Pura
Em lançamento da Editora UFMG, professor do Departamento de Filosofia propõe introdução didática e sistemática ao pensamento de Immanuel Kant
Aparentemente, há dois tipos de obras: aquelas que não exigem mais do que uma inteligência mediana para a compreensão, já que são concebidas para o consumo e o entretenimento amplo, e aquelas que, formuladas em razão de alguma nova e fundamental descoberta no campo de reflexão humana, não são motivadas pela preocupação de ser acessíveis. “Boa parte da obra kantiana se encontra nessa segunda classe, a começar pela Crítica da razão pura, verdadeiro atentado contra o bom senso, a opinião estabelecida e as convicções do público leitor”, diverte-se Joãosinho Beckenkamp, professor do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich). São “obras capitais escritas aparentemente para a eternidade e não para os debates do dia”, opina.
De fato, Immanuel Kant (1724-1804) ficou conhecido tanto pela pertinência, pela densidade e pelo avanço do seu pensamento filosófico, quanto pelo caráter complexo de seus textos, de difícil compreensão até mesmo para outros intelectuais. Com o intuito, pois, de ajudar estudiosos a desbravar a produção do filósofo alemão-prussiano e a se localizar no emaranhado de suas reflexões, Beckenkamp acaba de lançar pela Editora UFMG o livro Introdução à filosofia crítica de Kant, possivelmente a primeira exposição sistemática da obra do filósofo concebida originalmente em português. “Duzentos anos depois, tem-se hoje a oportunidade de registrar o sentido e a riqueza das contribuições de Kant para o pensamento filosófico com uma precisão e também com uma justeza que tinham de faltar a seus primeiros leitores”, escreve Beckenkamp, lembrando ser esta uma característica natural da grande filosofia: demandar tempo para alcançar a sua satisfatória recepção.
Fundamentação
Kant ocupa singular posição na genealogia da filosofia moderna: há uma “presença marcante do pensamento kantiano nas diversas correntes filosóficas que ainda dominam o cenário atual”, escreve Beckenkamp no volume que ora vem a público. No livro, o professor registra que a obra do filósofo, de alguma forma, fundou diferentes vertentes reflexivas, que posteriormente seriam desdobradas por nomes que vão de Martin Heidegger a Michel Foucault, ou de Friedrich Hegel, seu contemporâneo, ao americano Wilfrid Sellars, mais de um século mais tarde.
Heidegger parece ter sido quem mais precisamente demarcou a importância das reflexões de Kant para a aventura a que a filosofia se proporia a partir da segunda metade do século 18. “A filosofia de Kant põe pela primeira vez o todo do pensamento e da existência modernos sob a luz e a transparência de uma fundamentação”, escreve o autor de Kant e o problema da metafísica, entre 1935 e 1936. Com efeito, após um primeiro capítulo em que defende A atualidade da filosofia crítica kantiana, apresentando um panorama da recepção obtida pelas teses do filósofo desde sua época até os dias atuais, Joãosinho Beckenkamp divide a sua exposição em 11 outros capítulos, nos quais atravessa a “fundamentação” do “todo do pensamento e da existência” que o filósofo estabeleceu em suas obras, fornecendo uma linha de interpretação para o ousado programa filosófico do autor.
Livro: Introdução à filosofia crítica de Kant
Autor: Joãosinho Beckenkamp
Editora UFMG
454 páginas / R$ 66 (preço de capa)