Tensão pré-antártica
Grupo da UFMG estuda variações de humor em militares e pesquisadores que participam de treinamento preparatório para expedições no continente gelado
Todos os anos, pesquisadores e militares brasileiros são enviados para o ambiente mais hostil da Terra: a Antártica, continente com características extremas de temperaturas negativas, força dos ventos, incidência de raios UVA e alteração do ciclo claro-escuro – luz durante todo o verão e escuridão no inverno. Confinados em alojamentos ou acampamentos, os expedicionários dessa região ainda precisam lidar com o isolamento, a monotonia e a saudade de casa.
“Nesse ambiente, alguns indivíduos passam a apresentar humor aversivo, com aumento da tensão interpessoal e dos conflitos. Outros experimentam sensações positivas, como maior percepção de autossuficiência e capacidade de lidar com o estresse”, compara a professora Rosa Maria Esteves Arantes, do Laboratório de Neuro-imunopatologia (Nipe), do Departamento de Patologia do ICB. Desde 2013, ela coordena o projeto Sobrevivendo no limite: a medicina polar e a antropologia da saúde na Antártica, desenvolvido no âmbito do Programa Antártico Brasileiro (Proantar).
Com o objetivo de compreender variáveis relacionadas à psicologia e à biologia humana, o grupo liderado pela professora estudou a variação de humor de pesquisadores e militares participantes do Treinamento Pré-antártico (TPA), promovido anualmente pela Marinha do Brasil na Ilha de Marambaia, no Rio de Janeiro.
Questionário
O TPA é constituído de práticas que simulam o estresse vivenciado nas expedições, como a pressão de tempo para a realização de tarefas, a convivência intensa em grupos restritos e o esforço físico extenuante. “Com base nas respostas a um questionário aplicado antes e ao fim de uma semana de treinamento, foi possível predizer algumas alterações de humor dos expedicionários em campo antártico”, explica Rosa Arantes. O questionário utilizado na pesquisa é a Escala de Humor de Brunel (Brums), que contém 24 perguntas agrupadas em seis dimensões: tensão, fadiga, raiva, depressão, confusão e vigor.
Segundo apurou a professora, a maioria dos expedicionários acusou o mesmo grau de tensão tanto no primeiro quanto no último dia do TPA. “Isso indicaria a prevalência de um estado de alerta constante devido à demanda da situação”, observa Rosa Arantes. Militares e pesquisadores apresentam níveis diferentes de respostas ao treinamento. De acordo com a professora, no início do TPA os militares se revelam menos confusos em relação aos pesquisadores. Ao término do treinamento, os militares demonstraram menos raiva e mais vigor. “A maior confusão ou desorientação por parte da equipe de pesquisadores se deve provavelmente à vivência de uma situação nova, já que, para os militares, esse tipo de treinamento é uma situação relativamente familiar. Pela mesma razão, os militares tinham menos raiva e mais vigor ao longo da atividade”, interpreta a professora.
Para Rosa Arantes, a compreensão das respostas de humor no TPA e sua confrontação com os resultados do mesmo teste na Antártica representam mais um instrumento investigativo que facilitará a busca de soluções para minimizar os riscos do ambiente sobre a saúde física e mental dos participantes do Proantar. Com base nos resultados de fadiga e tensão, o grupo concluiu, por exemplo, que o treinamento físico pode ser uma estratégia importante para melhorar os estados de humor. “O aumento da força e da capacidade aeróbica pode fazer com que uma mesma demanda física exija menos esforço do indivíduo. Assim, os indicadores de fadiga frente a uma situação fisicamente estressante serão minimizados”, projeta a professora.
A próxima rodada do treinamento na Ilha de Marambaia será realizada de 8 a 14 de julho (primeira fase) e de 4 a 12 de agosto (segunda fase).
Projeto: Sobrevivendo no limite: a medicina polar e a antropologia da saúde na Antártica
Coordenação: Rosa Maria Esteves Arantes, do Laboratório de Neuroimunopatologia, do ICB
Financiamento: CNPq/Proantar (edital 64/2013)
Colaboração: Michele Macedo de Moraes (doutora em Ciências do Esporte/Laboratório de Fisiologia do Exercício, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional), Alexandre Sérvulo Ribeiro Hudson (doutorando/Lafise) e Ygor Tinoco Martins (Lafise)