Retrato literário de uma época

Política na Internet

Editora UFMG lança coletânea de ensaios com análises sobre papel das redes sociais no fortalecimento/enfraquecimento da democracia

Capa do livro: Democracia digital: Publicidade, instituições e confronto político
Capa do livro: Democracia digital: Publicidade, instituições e confronto político Reprodução

A Editora UFMG acaba de lançar o livro Democracia digital: publicidade, instituições e confronto político, que reúne 19 ensaios de 27 pesquisadores do Brasil e de países europeus sobre os impactos causados pelas novas tecnologias da informação e da comunicação – como as redes sociais – na política contemporânea. Organizado por Ricardo Fabrino, Marcus Abílio Pereira e Fernando Filgueiras, professores do Departamento de Ciência Política da UFMG, o volume dá acesso a reflexões caras não só a esse campo do conhecimento, mas também à sociologia, à filosofia, à comunicação social e à administração pública, às quais subjaz uma pergunta crucial: as contribuições que essas tecnologias oferecem à democracia a fortalecem ou a debilitam?

Na obra se discutem, por exemplo, os potenciais e os dilemas da deliberação ­on-line, as redes sociais como instrumentos de representação e construção da opinião pública e o estímulo que essas novas tecnologias oferecem, em tese, à construção de transparência no plano da gestão pública. Os mesmos ensaios se dividem entre as possibilidades de “ampliação do ideário democrático” e o alerta para os possíveis problemas que podem advir dessas tecnologias. Sobre isso escrevem os organizadores: 

“A visibilidade que pode informar e trazer pluralidade é a mesma que traz o risco do controle e da invasão à privacidade, na medida em que torna indivíduos mais vulneráveis. O acesso a uma profusão ininteligível de dados pode gerar mais opacidade em vez de transparência. A economia de compartilhamentos e curtidas e de mapeamento de percursos dos usuários cria novas formas de exploração de um trabalho que nem é percebido como tal. Se as comunidades podem ser espaço de afetos e solidariedade, elas também podem alimentar a intolerância e os discursos de ódio”.

Em seu conjunto, os textos sugerem que a relação entre a expansão dos meios digitais e o regime político não é linear e que a emergência de uma sociedade conectada em rede não implica necessariamente o fortalecimento da democracia. Na prática, essa ascensão intensificaria as disputas de poder, que podem resultar tanto no estímulo à construção de uma cultura política quanto no rompimento da cultura já existente.

Nada será como antes

O livro Democracia digital é fruto de colóquio realizado na UFMG no fim de 2013, poucos meses após a série de protestos e manifestações políticas que tomaram as ruas do país. Premido por aqueles fatos, o evento “viu-se profundamente atravessado pela necessidade de compreensão desse momento histórico. Viu-se, também, marcado pelo desejo de reflexão coletiva e aberta sobre o modo como as tecnologias da informação e da comunicação podem contribuir para construir, aprofundar ou para minar democracias na contemporaneidade”.

Esse desejo parece explicar a quantidade de ensaios que, reunidos na última parte do livro, investigam os sentidos desses protestos e manifestações. Ao todo, são quatro os ensaios que tratam essencialmente das jornadas de junho de 2013, espécie de marco zero da crise que, desde então, propiciou as mais imprevisíveis e contraditórias ­consequências políticas para a democracia brasileira.

Em A viralização da revolta em redes ­sociais, pesquisadores que atuam nos campos da comunicação e da computação analisam sobre textos, imagens e links que, à época, foram publicados em redes sociais de forma vinculada à hashtag #Vemprarua. Em Violência coletiva e o Facebook, pesquisadores da ciência política e da linguística investigam como a violência dos ativistas e da polícia foi percebida pelos próprios manifestantes durante a Copa das Confederações.

Em Imagens que informam, imagens que vinculam, pesquisadores com formações em comunicação, linguística e ciência da informação estabelecem comparação entre as coberturas feitas pelo Jornal Nacional e pelas mídias alternativas. Por fim, em As manifestações de junho: estratégia em rede para resistência civil, pesquisadores da ciência política e da comunicação cotejam os protestos brasileiros com casos de desobediência civil registrados em outras partes do mundo.


Livro: Democracia digital: Publicidade, instituições e confronto político
Organizadores: Ricardo Fabrino, Marcus Abílio Pereira e Fernando Filgueiras
Editora UFMG

503 páginas / R$ 70 (preço de capa)

Ewerton Martins Ribeiro