Centro de Memória da Letras será reaberto com exposição sobre literatura de cordel
Evento de retomada ocorrerá nesta terça, com exibição de 'folhetos', xilogravuras, álbuns e livros
Cordéis são livros artesanais de pequeno formato – 10 por 16 centímetros, aproximadamente – e com poucas páginas, em que se aborda, por meio de versos rimados e originários não raro de relatos orais, temas como o amor, a esperteza, a religiosidade, o cangaço. Além da tradicional versão de oito páginas, há versões com 16 ou mesmo 32, que são chamadas de romances, mas que obedecem à mesma lógica de artesania.
Nesta terça-feira, dia 30, será aberta no Centro de Memória da Faculdade de Letras da UFMG uma exposição sobre o tema, com a participação do autor Olegário Alfredo, também conhecido como Mestre Gaio (“mestre” é uma designação comum para os escritores de cordéis). O evento é uma realização da Faculdade de Letras em parceria com a Tipografia do Zé, ateliê de artes gráficas localizado no bairro Santa Efigênia, em Belo Horizonte.
Para a exposição, foram selecionados alguns “folhetos” (termo também usado para referir os cordéis) dos mestres Leandro Gomes de Barros, João Martins Athayde, José Bernardo da Silva e Rodolfo Coelho Cavalcanti, além de xilogravuras de J. Borges, Mestre Noza e José Soares. “Também serão expostos alguns poucos álbuns de gravura popular e livros que mostram um pouco da expressividade e importância da literatura de cordel para a cultura nordestina e nacional”, explica Flávio Vignoli, tipógrafo e editor da Tipografia do Zé.
Flávio Vignoli e Ana Utsch, professora do Departamento de Artes Plásticas da Escola de Belas Artes, são os curadores da exposição. O Centro de Memória, por sua vez, é coordenado por Sônia Queiroz, professora aposentada da Faculdade de Letras da UFMG, e seu conselho curador é formado por Sônia, Ana, Maria Cândida Seabra e Tereza Virgínia Ribeiro Barbosa, ambas professoras da Fale.
'Fabuloso imaginário popular'
Segundo o curador Flávio Vignoli, a literatura de cordel teve, no Brasil, importância muito grande na promoção do debate das questões culturais e sociais, como vetor das histórias e políticas locais e nacionais. “Principalmente no interior do Nordeste, ela foi considerada uma espécie de jornal para aqueles que não eram alfabetizados”, explica o artista gráfico. Além disso, em razão de sua poesia e seu humor próprios, o formato foi muito usado como recurso para a documentação do que Vignoli trata como o “fabuloso imaginário popular”.
“Essa ‘literatura de cordel’, termo como é hoje conhecida, na verdade, toda uma frente da literatura popular, tem origem na literatura francesa de colportage, uma expressão literária que era popular na França a partir do século 17, e nos romances ibéricos chamados de pliegos sueltos”, ele detalha. A exposição marca a reabertura física do Centro de Memória da Fale, que ficou fechado nos últimos anos em razão da pandemia.
Segundo o curador, as capas dos folhetos, até a década de 1930, não traziam as tradicionais xilogravuras, apenas vinhetas ou fotografias de cartões-postais, do padre Cícero, de artistas de cinema e de outras imagens impressas em clichê metálico. “Foi somente a partir da década de 1940 que a xilogravura começou a ser utilizada na capa dos folhetos, gravada em casca de cajá, imburana, pau-amarelo, mogno ou cedro”, detalha.
A exposição ficará no Centro de Memória de 30 de agosto a 27 de outubro. Gratuitas, as visitas ao espaço podem ser feitas de segunda a quinta-feira, das 15h às 19h. A Faculdade de Letras da UFMG fica no campus Pampulha, situado à Avenida Antônio Carlos, 6.627
Sobre o Centro de Memória
Criado em 2014, o Centro de Memória da Faculdade de Letras é um espaço de conservação e exposição de documentos, publicações – acadêmicas e literárias – e objetos que contam a história da faculdade. Além de guardar e expor essa memória institucional, o espaço sedia regularmente exposições temporárias relacionadas, em alguma medida, à trajetória acadêmica e criativa da unidade.
Segundo descrição no site da faculdade, a criação e manutenção do Centro de Memória situa-se no âmbito da política estabelecida pela UFMG ao criar a sua Rede de Museus, algo “que reforça o caráter democrático da Universidade ao abrir ao público a sua trajetória institucional, que vem a ser, em última instância, uma parte significativa da história das ciências e das artes no Brasil”.
As exposições mais comuns no espaço ocorrem ao modo “gabinete do livro”, programa criado no Centro Cultural UFMG em 2010 com foco em exposições editoriais de pequeno porte. O programa foi deslocado para o Centro de Memória em 2017, deflagrando uma série de mostras. Sediada nesse programa, a exposição Literatura de cordel seria realizada em 2020, mas foi suspensa em razão da pandemia.