Pesquisa e Inovação

Fatores psicossociais e insatisfação com o trabalho provocam adoecimento de professores

Pesquisa realizada na Faculdade de Medicina ouviu 5,6 mil docentes brasileiros e portugueses

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Múltiplos fatores contribuem para o adoecimento em sala de aulaFoto: Arquivo Centro de Comunicação Social | Faculdade de Medicina da UFMG

A literatura especializada sustenta que os professores formam o grupo ocupacional mais exposto ao estresse devido às demandas de trabalhos e outros fatores. Esse estresse, somado a fatores psicossociais e à insatisfação com o trabalho, pode causar adoecimento físico e mental dos docentes.

De acordo com pesquisa realizada pela pesquisadora Nayara Ribeiro Gomes no âmbito do Programa de Pós-graduação em Ciências Fonoaudiológicas da Faculdade de Medicina da UFMG, sob orientação da professora Adriane Mesquita e da pesquisadora Bárbara Antunes, reconhecer os fatores envolvidos na piora da saúde da população de professores do segundo segmento do ensino fundamental (6º ao 9º ano) pode contribuir para melhor compreender suas relações com o trabalho.

O estudo Teaching and learning international survey (Talis), que se valeu de dados secundários do banco, com inquérito realizado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), investigou associações entre o adoecimento de professores da educação básica e os fatores psicossociais do trabalho. Além disso, Nayara Ribeiro analisou o impacto negativo do trabalho na saúde física e mental na visão dos docentes e a associação com fatores sociodemográficos.

“Eles estão expostos a ruídos e a doenças vocais. Há outros fatores impactantes, como o salário baixo, a falta de apoio social, segurança e valorização. Se o professor trabalha em uma área com altos índices de vulnerabilidade, ele pode estar mais suscetível à violência”, exemplifica a pesquisadora.

Fatores psicossociais são aqueles relacionados às interações entre o ambiente, as condições, a organização, gestão e conteúdo e as características individuais dos trabalhadores. Essas variáveis podem causar danos à saúde e repercutir no desempenho e satisfação com o trabalho.

Salário baixo no Brasil, estresse em Portugal
O estudo ouviu 5.614 professores, sendo 2.217 brasileiros e 3.397 portugueses. Dos brasileiros, 27,3% afirmaram que o trabalho impacta negativamente a saúde física, e 27% disseram que ele traz prejuízos à saúde mental. Entre os docentes portugueses, os índices são mais altos: 59,4% relataram impacto negativo da atuação em sala de aula na saúde física, e 64,9% disseram que sua saúde mental é afetada pelo trabalho como professor.

“A realidade política é um pouco diferente da nossa, e há também a questão populacional. Portugal é um país bem menor que o Brasil, mas eu acredito que as diferenças estejam centradas nas questões políticas do trabalho. Os portugueses são os que mais relatam o estresse sofrido no trabalho, mas eles não demonstram insatisfação com o salário, que é muito citada entre os professores brasileiros”, pontua Nayara.

Segundo ela, quase a totalidade dos professores portugueses (98,8%) relataram se sentir estressados no trabalho, enquanto 37,5% de docentes brasileiros afirmaram lidar com essa questão. No caso brasileiro, a variável salário tem um peso muito maior como fator de insatisfação.

Entre as principais causas de adoecimento de professores, foram identificados transtornos mentais comuns (TMC), como ansiedade, depressão e sofrimento emocional (53,3%), dor musculoesquelética (DME) – na região lombar, nos ombros, braços e nas pernas (26,7%) – e Síndrome de Burnout (6,6%).

Por meio de uma revisão sistemática da literatura, o estudo revelou que transtornos mentais comuns, dor musculoesquelética e a Síndrome de Burnout estão associados significativamente a baixo apoio social, carga elevada de trabalho, altas demandas, baixo controle no trabalho, clima organizacional, ambiguidade de papéis, condições estressantes, desequilíbrio entre esforço e recompensa, baixo apoio da família, demandas relacionais (professor-pais-alunos), intimidação e insegurança.

Para Nayara, uma forma de evitar ou, ao menos, minimizar os impactos do adoecimento de professores seria a adoção de políticas públicas com cuidados direcionados à promoção e prevenção da saúde. Os quadros podem ser melhorados se houver ações de apoio social no âmbito das escolas para aliviar demandas, carga horária e equilibrar trabalho e vida pessoal.

Mulheres e tempo de carreira
O impacto negativo da insatisfação com o trabalho sobre a saúde física e mental revelou-se mais evidente entre mulheres com idade de 40 a 59 anos e entre profissionais com tempo de carreira igual ou superior a 11 anos. Integrantes desses grupos alegaram não ter tempo para a vida pessoal e manifestaram insatisfação geral com o trabalho, com o salário e com as recompensas recebidas. “No caso das mulheres, isso certamente está relacionado com a necessidade de equilibrar múltiplos papéis na vida. Além de trabalhar fora, elas têm as tarefas de casa, que contribuem muito para o cansaço físico e mental”, afirma a pesquisadora.

A íntegra da reportagem, que também detalha as diferenças entre grupos de professores portugueses e brasileiros, pode ser lida no Portal da Faculdade de Medicina.

Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina