Atual e interdisciplinar

Rede de estereótipos

Pesquisadores do DCC identificam, em mecanismos de busca na web, padrões que relacionam raça, idade e beleza feminina

Ilustração
Ilustração Lucas Braga

As mulheres negras e as mais velhas estão muito associadas a estereótipos negativos para aparência física nas buscas realizadas no Google e no Bing, dois dos principais mecanismos de procura de informações na internet. A constatação foi feita pelos pesquisadores Virgílio Almeida, Wagner Meira Jr. e Camila Souza Araújo, do Departamento de Ciência da Computação (DCC) do Instituto de Ciências Exatas (ICEx) da UFMG.

A investigação que utilizou o Google revelou que as mulheres negras são consideradas menos atraentes em 86% dos países pesquisados, incluindo Nigéria e Brasil, entre outros com população de origem majoritariamente negra. Na Malásia, por exemplo, o componente racial não influencia significativamente, e os rostos muito jovens é que são considerados belos.

Os resultados do estudo foram organizados no artigo Identifying stereotypes in the online perception of physical attractiveness, aceito para publicação na 8th International Conference on Social Informatics (SocInfo 2016). A pesquisa tomou como base três perguntas principais: é possível identificar estereótipos para beleza feminina nas imagens disponíveis na web? Como raça e idade influenciam esses estereótipos? E como essa percepção varia entre países e regiões? Os pesquisadores procuraram padrões de características femininas consideradas agradáveis e bonitas por diferentes culturas e também aquelas classificadas como feias.

Banco de imagens

O estudo começou por buscar no Google e no Bing “mulheres bonitas” e “mulheres feias”. Foram coletadas as 50 primeiras imagens em 42 países. Com ajuda do Face++, programa que detecta rostos nas fotografias e que infere informações como idade, raça e gênero com precisão superior a 90%, foi obtida a classificação das fotos e criado banco para a condução das análises.

Além dos estereótipos negativos para mulheres negras e positivos para as brancas, assim como os estereótipos negativos para as mulheres mais velhas, válidos para a maioria dos países, o estudo constatou padrões comuns a grupos de países. Por exemplo, na parte da pesquisa que utilizou dados do Google, a Espanha e países das Américas, incluindo o Brasil e os Estados Unidos, formam grupo em que o estereótipo vinculado a mulheres negras é muito negativo. Já os dados coletados para Irlanda, Áustria, Alemanha e Grécia mostram que suas populações alimentam imagem mais negativa das mulheres asiáticas que das negras no que se refere à beleza física.

No grupo composto de Rússia, Índia, Dinamarca, Ucrânia, Coreia do Sul, Quênia, Finlândia, Japão, Uzbequistão e Afeganistão, não foram identificados de forma importante estereótipos relacionados a raça.

Padrões e composição racial

Uma vertente da investigação procurou aprofundar a compreensão dos estereótipos por meio da tentativa de relacionar a composição racial de alguns países com os padrões observados. Japão, Argentina, África do Sul e Estados Unidos contam com diferentes proporções de população negra, mas em todos eles – com exceção do Japão, no Google, e da Argentina, no Bing –, está presente o estereótipo negativo vinculado às mulheres negras. “Não encontramos nenhuma relação específica entre a composição racial de um país e os padrões de estereótipos identificados”, escrevem os pesquisadores.

Na seção de conclusões do artigo, os autores destacam que não conhecem as razões para a existência dos estereótipos identificados e que eles podem surgir da combinação do estoque de fotos disponíveis com as características de indexação e ranqueamento dos mecanismos de busca. 

“O estoque de fotos on-line pode refletir preconceitos do mundo real que são transferidos para o mundo virtual pelos mecanismos de busca. Dada a importância desses mecanismos, sugerimos que eles analisem os problemas causados pela presença destacada dos estereótipos negativos e encontrem caminhos algorítmicos para minimizá-los”, afirmam os autores em seu texto.

Eles acrescentam que novos estudos poderiam lançar mão de mechanical turks – grupos de pessoas que realizam tarefas de validação das técnicas e algoritmos – para analisar as características de imagens de rostos e gerar descrição mais detalhada dos gêneros de estereótipos. Outro caminho para a pesquisa nessa área, segundo Camila Araújo, Wagner Meira Jr. e Virgílio Almeida, pode ser a comparação das características identificadas pelo olho humano com os resultados dos diversos sistemas de reconhecimento facial.

[Matéria publicada no Portal UFMG, seção Pesquisa e Inovação, em 24/08/2016]

Itamar Rigueira Jr.