O poder das perguntas
Projeto de divulgação científica para crianças completa dez anos e é reconhecido pela Fapemig no campo da inovação em tecnologias educacionais
O sociólogo francês Michel Maffesoli prega a escola baseada na interação, que substitui a imposição de saberes. Muitas instituições de ensino básico, algumas delas no Brasil, e não raro sob inspiração da portuguesa Escola da Ponte, já experimentam relações entre professores e alunos menos marcadas pela hierarquia e apostam em estruturas curriculares que propiciem a aprendizagem por livre escolha. Na UFMG, há exatos dez anos, está em plena atividade a Universidade das Crianças, que, também nessa direção, desenvolve metodologia própria.
Perguntas apresentadas pelas próprias crianças, em sua maioria de 9 a 14 anos, guiam a abordagem de temas científicos, em ambientes descontraídos, onde cada criança tem a opção de escolher o que fazer entre atividades diversas propostas pela equipe do projeto.
"Dar visibilidade às diferenças e valorizá-las, evitar os estereótipos e desconstruir a ideia de corpo normal são algumas de nossas preocupações”
“Pretendemos suscitar o encantamento pelo conhecer. O trabalho em oficinas procura induzir que cada uma das crianças trace o seu percurso singular. No início, abordávamos vários temas, mas atualmente nosso foco é o corpo humano e suas relações com o meio. Não apenas o corpo orgânico, mas o biopsicossocial. Dar visibilidade às diferenças e valorizá-las, evitar os estereótipos e desconstruir a ideia de corpo normal são algumas de nossas preocupações”, explica a professora Débora d’Ávila Reis, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), coordenadora do projeto.
Sempre com a colaboração das crianças, são criados e produzidos textos ilustrados, programas radiofônicos, curtas de animação e livros. O Universidade das Crianças, que também é um projeto de inovação e de produção de tecnologias educacionais e de divulgação científica, foi selecionado pela Fapemig para participar da mostra Inova Minas, realizada em agosto, no Circuito Cultural Praça da Liberdade.
Ampliar escala
Para Débora d´Ávila, uma das questões fundamentais que precisa ser encarada por aqueles que trabalham na divulgação científica é o tamanho do público alcançado. O site e a página no Facebook do Universidade das Crianças são muito visitados, e os vídeos, disseminados por todo o Brasil, mas o número de crianças contempladas com o trabalho presencial ainda é considerado muito pequeno, mesmo levando em conta as pessoas atingidas indiretamente, como familiares dos alunos, professores e funcionários das escolas. Uma das iniciativas da equipe que visa ampliar a escala de público é o apoio à abertura de outras universidades das crianças, em cidades como Diamantina, Ouro Preto e Betim.
“A ideia é consolidar uma rede que propicie a troca de experiências, o planejamento de ações comuns, a formação de multiplicadores e a cooperação na produção de materiais de divulgação científica para e com o público infantojuvenil”, diz a coordenadora. Uma das inspirações é a Rede Europeia de Universidades das Crianças.
Textos, ilustrações e vídeos elaborados pelo Universidade das Crianças UFMG são utilizados há muito tempo por escolas e outras instituições – e mais recentemente têm atraído interesse formal de coordenadores de plataformas educacionais brasileiras e estrangeiras. Com o apoio da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT) da UFMG, o projeto tem considerado, segundo Débora d’Ávila, a possibilidade de transferência de seus produtos para empresas privadas, “naturalmente sem comprometer o trabalho realizado por meio do site, dos festivais e das oficinas presenciais”.
O Universidade das Crianças UFMG é financiado pela Capes, CNPq, Fapemig e Pró-reitoria de Extensão e tem contado com o talento e o envolvimento de alunos de graduação de diversas áreas, de pós-graduação do ICB e da FaE, dos profissionais Mateus di Mambro, Marcela Werkema, Fabiano Bonfim, Bruno Sommerfeld e Bruno Lanza, formados pela Escola de Belas-Artes, de professores como Mauricio Gino, também da Belas-Artes, e da psicóloga Cristina Reis, consultora educacional na área de gênero.