Há vagas. Falta inclusão
Revista da Fafich traz dossiê sobre os desafios impostos pelo mercado de trabalho relacionados ao ingresso de pessoas com deficiência
No Brasil, apenas 37% das vagas de emprego legalmente reservadas para pessoas com deficiência são efetivamente preenchidas por esses profissionais. O restante, mais de 500 mil vagas, segue ocupado por pessoas sem deficiência, em um explícito descumprimento da Lei de Cotas (Lei 8.213, de 1991). Em Belo Horizonte, a situação é ainda pior: apenas 29% das vagas destinadas a pessoas com deficiência estão preenchidas por esse público, o que representa mais de 30 mil postos de trabalho ocupados indevidamente na cidade.
“O que mais motivou o dossiê foi termos conseguido a lista das empresas de Belo Horizonte que nos últimos dois anos não cumpriram a Lei de Cotas”
Essas informações foram apuradas por estudantes do curso de Comunicação Social da UFMG e estão reunidas no dossiê Mercado de trabalho e deficiência, que acaba de ser publicado na mais recente edição da revista Transite, da Fafich. A publicação é coordenada pelos professores Elton Antunes e Bruno Souza Leal, ambos do Departamento de Comunicação Social (DCS). O dossiê foi editado por Bruno Fonseca, aluno do Programa de Pós-graduação em Comunicação Social, e produzido pelos alunos Gabriel Martins, Gabriel Rodrigues, Júlia Valadares e Kaio H. Silva.
“O que mais motivou o dossiê foi termos conseguido a lista das empresas de Belo Horizonte que nos últimos dois anos não cumpriram a Lei de Cotas”, explica Bruno. “De início, o Ministério do Trabalho não quis repassar a informação, mas fizemos a solicitação via Lei de Acesso à Informação, e eles tiveram de nos enviar”, afirma o editor. Na lista, estão a segunda maior construtora do Brasil, um dos maiores grupos de ensino do mundo, o mais tradicional jornal de Minas Gerais e uma das principais montadoras de veículos do estado.
Conforme apuraram os estudantes, mais de 200 empresas da capital mineira foram multadas nos últimos dois anos por não cumprirem os percentuais de contratação estabelecidos na legislação. No site, foi disponibilizada lista das empresas destinatárias das dez maiores multas aplicadas pelo Ministério do Trabalho nesses dois anos, que totalizam mais de R$ 2 milhões. “Fizemos contato com todas essas dez empresas, de forma a oferecer a elas a oportunidade de apresentar a sua versão dos fatos”, afirma Fonseca.
Quando a lei não resolve
A investigação realizada pela equipe da revista sugere que muitas empresas consideram ser mais cômodo descumprir a legislação e arriscar-se à multa do que investir na contratação de pessoas com deficiência. “Antes da multa, a empresa recebe uma notificação e tem um prazo para se regularizar. As empresas podem ser notificadas várias vezes, antes de serem multadas. Quando vem a multa, a empresa ainda pode recorrer. E, se condenada, ela conta com 50% de desconto se pagar em até dez dias. Isso tudo estimula várias empresas a postergar essa contratação”, diz.
"Existe uma ideia corrente de que não há pessoas com deficiência qualificadas para ocupar bons cargos, o que não é verdade”
Bruno Fonseca explica que há muito desconhecimento e preconceito. “Muitas empresas não têm contato com ONGs, às vezes nem sabem como contratar. Mas em parte o que há é má vontade mesmo. Existe uma ideia corrente de que não há pessoas com deficiência qualificadas para ocupar bons cargos, o que não é verdade”, afirma.
O dossiê hospedado no site da revista reúne quatro grandes reportagens, abordando, entre outros assuntos, histórias de profissionais que conseguiram um lugar no mercado e as dificuldades encontradas por aqueles que têm deficiências mais restritivas ou que buscam vagas em cargos não operacionais. Todas as reportagens são multimídia – reúnem textos, áudios, vídeos, imagens e infográficos.