Copa, doce Copa
Estudo do ICB demonstra que arborização favorece biodiversidade de aves no ambiente urbano
A arborização reduz os efeitos da urbanização sobre as aves,
título de um dos capítulos de sua tese de doutorado, já oferece uma pista das conclusões do estudo do biólogo João Carlos Pena, desenvolvido em parceria com pesquisadores da Unesp e da Universidade de Salford, no Reino Unido. Regiões de Belo Horizonte com mais árvores, principalmente quando nelas predominam espécies nativas e plantas mais largas, tendem a reunir maior número de aves.
Recém-doutor pelo Programa de Pós-graduação em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre do ICB, João Carlos Pena percebeu, logo no início de sua caminhada, que havia poucas pesquisas a respeito dos efeitos das características da vegetação presente nas ruas e avenidas sobre a vida animal. “A rua é local de interação do homem com a biodiversidade. Nela, pessoas e carros circulam todos os dias. Portanto, bichos e plantas são diretamente afetados pelo impacto gerado nesse ambiente, como poluição e ruído”, comenta o pesquisador.
Seu estudo contemplou 60 pontos em bairros da Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Munido de binóculo, gravador e medidor de decibéis, João Pena percorreu algumas das principais avenidas – Afonso Pena e Amazonas – e praças – Raul Soares, da Liberdade e da Assembleia – da capital mineira. Ele esteve três vezes em cada local de observação e monitorou o comportamento de 73 espécies de aves. “Um pequeno número (algumas semelhantes entre si) apresentava grande dominância nesse universo”, constatou.
Em suas incursões, ele registrava, por exemplo, se as aves estavam pousadas no local ou apenas de passagem e se faziam ninho ou comiam alguma coisa no momento da observação. Também foram avaliadas características da paisagem, como distância dos parques urbanos, quantidade de vegetação e de impactos humanos, baseando-se no número de habitantes e no nível de ruído gerado – fator que tende a ser mitigado pela arborização urbana, que pode oferecer abrigos mais distantes da fonte do barulho, além de alimentos e locais para formação de ninhos.
Ruído
Segundo o pesquisador, o ruído é fator crucial para a qualidade de vida dos animais no ambiente urbano. O barulho afeta diretamente a sua comunicação, pois pode atrapalhar sua percepção em relação à chegada de um predador e obrigá-los a cantar mais alto, o que altera a frequência do canto.“Nos gráficos que gerei para a pesquisa, percebe-se que os bichos evitam ambientes ruidosos. As ruas mais calmas, em bairros como Mangabeiras e Santa Lucia, são lares de muitas espécies.”
De posse dessa observação, João Carlos Pena avaliou a influência de características das árvores e da paisagem sobre o número de espécies de aves, sobre o número de indivíduos e sobre alguns de seus traços funcionais – fatores que permitem à espécie viver em determinado ambiente. Os traços escolhidos influenciam diretamente os processos ecológicos importantes em determinada paisagem: o peso do animal, o local onde prepara seu ninho (aves que fazem ninho em cavidades, por exemplo, adaptam-se melhor ao espaço urbano porque podem ocupar fendas em prédios, por exemplo), o tamanho de sua ninhada e como procura alimento.
De acordo com o Sistema de Inventário de Árvores de Belo Horizonte (SIIA-BH), a região Centro-Sul abriga, em seus logradouros públicos, aproximadamente 90 mil árvores de 475 espécies. Apesar da aparente diversidade, apenas dez espécies representam 41% de toda a comunidade. Outro aspecto que preocupa o pesquisador é o fato de, entre as dez espécies dominantes, seis serem exóticas e quatro, nativas. A espécie mais populosa da Centro-Sul é a nativa Sibipiruna (Caesalpinia pluviosa).
“É extremamente importante diminuir a dominância de poucas espécies e ampliar o plantio de árvores nativas, pois elas oferecem mais recursos dentro de seus ambientes naturais. Além disso, o cultivo nas cidades de árvores da flora brasileira ameaçadas de extinção pode ser importante estratégia de conservação”, analisa o biólogo.
Mas é possível ir além, avalia João Carlos Pena. “Outros trabalhos mostram que é possível ter um bom nível de biodiversidade em uma metrópole e, para isso, é necessário pensar não só na arborização. Deve-se promover, por exemplo, a conexão entre os parques urbanos, com a formação de corredores ecológicos, que podem ser multifuncionais, abrigando ciclovias”, sugere.
O trabalho foi orientado pelo professor Marcos Rodrigues, do Departamento de Zoologia do ICB, e coorientado pelo professor Milton Ribeiro, da Unesp, que ministrou aulas na UFMG em 2014. Durante o desenvolvimento da pesquisa, João Carlos Pena contou com a colaboração de três outros pesquisadores. O professor da Universidade de Salford Robert Young estava em Belo Horizonte quando Pena apresentou-lhe seu projeto. A abordagem resultou em um doutoramento sanduíche na instituição, que fica em Manchester, no Reino Unido, e possibilitou o encontro com Richard Armitage, especialista em ecologia de paisagens. Os ingleses colaboraram nas análises, e o pesquisador da Unesp Felipe Martello contribuiu com as avaliações dos índices de diversidade funcional.
Tese: Aves, infraestrutura verde e planejamento ambiental em paisagens urbanas neotropicais
Autor: João Carlos Pena
Orientador: Marcos Rodrigues (UFMG)
Coorientador: Milton Ribeiro (Unesp)
Defesa: 27 de abril de 2017, no Programa de Pós-graduação em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre do ICB