Direito de todo dia
Livro da professora Mônica Sette Lopes contém histórias e reflexões sobre a importância de divulgar temas jurídicos com mais clareza
Ao longo de sua trajetória, Mônica Sette Lopes, professora da Faculdade de Direito da UFMG e desembargadora do trabalho recém-aposentada, tem dedicado parte de suas intervenções, em sala de aula e em diversos outros espaços, à defesa da comunicação mais ampla e mais clara do direito. O objetivo é facilitar o acesso a um mundo ainda marcado por uma escrita abstrata e rebuscada, tornando termos técnicos mais conhecidos de todos.
“É preciso dar a conhecer a experiência corriqueira de ser juiz, aquela vinculada à oralidade das salas de audiência”, afirma Mônica Sette Lopes, que tem dado tratos práticos às suas convicções – ela produz e apresenta, há mais de dez anos, o programa Direito é música, na Rádio UFMG Educativa e em outras emissoras públicas. Ali, ela associa as mensagens de canções a questões da filosofia e do cotidiano do direito.
Em mais um ato de sua faceta de comunicadora, Sette Lopes acaba de publicar o livro A crônica da Justiça (Editora Initia Via), que reúne textos publicados a partir de 2008 no portal web do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. À época das publicações na internet, ela desenvolvia projeto como residente do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (IEAT), da UFMG.
“A tentativa de revelar espantos e não saberes. De vestir o direito com a imaginação. De estimular aqueles que trabalham na produção das decisões judiciais a se expandirem na expressão das circunstâncias que experimentam.”
Como diz a autora no texto que abre o volume, as crônicas representam “a tentativa de revelar espantos e não saberes. De vestir o direito com a imaginação. De estimular aqueles que trabalham na produção das decisões judiciais a se expandirem na expressão das circunstâncias que experimentam”.
Histórias e poesia
Em 30 textos, quase sempre ilustrados com referências artísticas e histórias vividas por ela ou emprestadas de outros, Mônica Sette Lopes aborda, em tom muitas vezes poético, questões como os juízes e a memória, direito e jornalismo, antecipação de riscos, direito do trabalho, assédio moral, pesquisa sobre o dia a dia dos tribunais, relações em sala de aula e necessidades da investigação acadêmica.
Em crônica sobre a linguagem hermética do direito, ela critica a obsessão pelo uso de termos que afastam o leitor leigo e criam ruído. “Não há por que tratar a Constituição por Carta Magna, chamar mandado de segurança de writ of mandamus e o Código de Processo Civil de álbum de ritos pátrio. Uma das justificativas é não repetir as palavras, mas isso não torna o texto mais leve, muito pelo contrário. E ainda leva a imprecisões”, diz a autora.
Em outro texto do volume, Mônica recorda a angústia de um ex-aluno que, depois de estudar tanto para um concurso e tornar-se juiz, depara com a realidade da sala de audiências, com ações e reações das partes, dos advogados e dele próprio. “A sala de audiências é a porta através da qual o direito encontra a rua”, escreve. E a título de dica para o colega novato, ela revela que procurava “adotar, com algum sucesso, a postura da fala franca e, sempre que possível, mansa. E exercitar uma paciência pedagógica: aquela que é usada nas salas de aula para ensinar a pensar e a ter dúvidas”.
A respeito do esforço para medir resultados e diagnosticar necessidades do trabalho no Poder Judiciário, Mônica Sette Lopes critica o viés quantitativo ainda quase exclusivo nos estudos e diz que é essencial pesquisa qualitativa de aprofundamento. “Como o juiz que vira número pode sair do escuro do papel e traduzir sua experiência de estar todos os dias, meses, anos à disposição para decidir a vida dos outros? Como o juiz que vira número pode dar a conhecer o processo de mudar uma cultura enquanto contribui para sua mudança?”, ela indaga, no livro.
A professora e atual vice-diretora da Faculdade de Direito defende que as atividades de sala de aula, pesquisa e extensão devem valorizar a combinação da teoria do direito com a realidade prática. “No dia a dia, tudo acontece. Não se trata apenas de interpretar a lei, mas de aplicá-la e executar sentenças com base em contingências as mais diversas”, reflete Mônica Sette Lopes.
Livro: A crônica da Justiça
Autora: Mônica Sette Lopes
Editora: Initia Via
258 páginas / R$ 24,50