Artistas sem fronteiras
Exposição que integra colóquio sobre intermidialidade reúne obras de arte que dialogam com áreas diversas da ciência e tecnologia
O carioca radicado nos Estados Unidos Eduardo Kac terá a instalação de arte transgênica Gênesis, uma das obras icônicas de sua trajetória e também da chamada bioarte, montada em Belo Horizonte pela primeira vez. O trabalho, que vai ocupar a galeria da Escola de Belas Artes da UFMG, integra a mostra Polímatas, que será inaugurada no campus Pampulha nesta semana. O circuito, por sua vez, é parte da programação do2º Colóquio Internacional Escrita, som, imagem, promovido pelo Grupo Intermídia, em parceria com a Diretoria de Ação Cultural (DAC).
A exposição – seu título faz referência aos indivíduos cujo conhecimento não está restrito uma determinada área – reúne 46 artistas que, em linguagens e suportes variados, criam por meio de uma interseção entre campos do conhecimento, como a física, a engenharia, a geografia, a ecologia e a comunicação. Além de Gênesis, a mostra terá, entre outras obras, uma videoinstalação de Éder Santos, um vídeo algorítmico de Giselle Beiguelman, livros de artista de Waltércio Caldas e Marilá Dardot e obras inéditas de Lucas Dupin e Sara Não tem Nome.
A exemplo de cientistas e pesquisadores, artistas também passaram, nos últimos tempos, a atuar na zona de encontro entre diferentes mídias, linguagens e disciplinas.
De acordo com a equipe de curadoria – formada pelos professores da UFMG Maria do Carmo Veneroso, Marilia Andrés Ribeiro, Pedro Veneroso e Tania Araújo –, a exemplo de cientistas e pesquisadores, artistas também passaram, nos últimos tempos, a atuar na zona de encontro entre diferentes mídias, linguagens e disciplinas. “Com isso, tornou-se cada vez mais claro que a arte, a ciência e a tecnologia podem se nutrir mutuamente de metodologias, práticas, assuntos, teorias e imaginários compartilhados”, afirmam os curadores.
Na área externa da Face, Cinthia Marcelle e Pedro Veneroso promoverão uma intervenção que fará os postes de iluminação parecerem vagalumes durante a noite. Circuitos desenvolvidos pelos próprios artistas compõem-se de uma placa microcontroladora e relés que são ativados em intervalos diferentes para cada poste. Pierre Fonseca vai instalar cones na copa de uma árvore próxima ao prédio da Reitoria e conectá-los a tubos e fones de ouvido. A ideia é oferecer aos passantes o contato com a “paisagem sonora” lá do alto.
Morse e DNA
Concebida há 20 anos, Gênesis foi realizada originalmente no festival Ars electronica, em Linz, Áustria. Os curadores explicam que Kac criou um “gene de artista”, por meio da tradução de um trecho em inglês do Velho Testamento para código Morse e, então, para uma sequência de DNA, de acordo com um código desenvolvido especialmente para a obra. O gene foi introduzido em bactérias dispostas em placas de Petri. Na instalação, uma placa fica sobre uma caixa de luz ultravioleta, controlada por participantes remotos na web. Ao acionar a luz UV, eles causam mutações no código genético das bactérias, alterando o texto codificado.
Do teatro ao digital
O colóquio Escrita, som, imagem é organizado pelo grupo Intermídia, que reúne pesquisadores das áreas de Letras, Belas Artes, Música e Comunicação. Em palestras e debates, cerca de 400 cientistas, artistas e estudantes vão tratar de questões dos campos da literatura, artes visuais, cinema, música, teatro, arquitetura e mídias digitais.
Nas conferências principais, o escritor, músico e professor da USP José Miguel Wisnik vai abordar Literatura, voz e performance; o filósofo Paulo Pires do Vale, da Universidade Católica Portuguesa, vai mostrar como o livro se comporta em exposição, como ele ganha autonomia e se transforma em obra de arte; Walter Moser, da Universidade de Ottawa (Canadá), apoiado em análise da intermidiática abertura das Olimpíadas de Beijing (China), em 2008, vai tratar de estética e poder; Eduardo Kac, vinculado à School of the Art Institute of Chicago, falará sobre telepresença e bioarte.
As produções contemporâneas, ao lançar mão de textos de naturezas diversas, instigam a repensar o conceito de arte e propõem desafios aos campos disciplinares institucionais, afirmam os organizadores do colóquio. A intermidialidade não constitui, segundo eles, um campo novo, mas um conjunto de métodos e conceitos que se prestam ao estudo de múltiplos tipos de fenômenos artísticos, literários e culturais, com apoio da filosofia, da estética, da história da arte e da história da escrita.