Listar para preservar
Pesquisador do ICB participa de mapeamento inédito, por estado, de espécies brasileiras de répteis
O Brasil é o terceiro maior celeiro de diversidade de répteis. Em todo o território nacional, já foram descritas 795 espécies, quantidade que situa o país atrás apenas da Austrália (1.057) e do México (942) – no mundo, são aproximadamente 11 mil espécies de répteis catalogadas. Esses dados constam do artigo Répteis do Brasil e suas unidades federativas: lista de espécies, de Henrique Caldeira Costa, recém-doutor em Zoologia pela UFMG, e Renato Silveira Bérnils, professor do Departamento de Ciências Agrárias e Biológicas da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
Publicado na revista Herpetologia Brasileira, da Sociedade Brasileira de Herpetologia (SBH), o levantamento atualiza a lista de todas as espécies de répteis do Brasil. Em uma ação inédita, os pesquisadores também mapearam as espécies existentes em cada um dos 26 estados, além do Distrito Federal.
A produção científica na área da taxonomia – ciência que busca descrever, identificar e classificar os seres vivos – é incessante. Por isso, uma lista de descrição das espécies deve ser atualizada periodicamente. “Desde 2005, quando a SBH publicou a primeira compilação dos répteis brasileiros, nove espécies, em média, foram descobertas por ano”, informa Henrique Costa.
Para coletar os dados que compõem a nova lista de espécies de répteis brasileiros, os autores analisaram mais de mil descrições, revisões taxonômicas, inventários e notas de distribuição geográfica divulgados em publicações científicas, desde a última atualização, em 2015.
De acordo com o pesquisador, a lista concentra informações de várias pesquisas em um só lugar, e a inclusão do mapeamento por estados possibilita estudos mais regionalizados. Segundo Henrique Costa, a lista se transformou em referência para pesquisadores, consultores ambientais, organizações públicas e privadas e é citada principalmente em inventários e estudos de impacto ambiental.
Exclusivas do Brasil
De acordo com o estudo, no Brasil são conhecidas 36 espécies de cágados, tartarugas e jabotis, répteis que pertencem à ordem dos Testudines, por terem o corpo recoberto por carapaças. Da ordem Crocodylia – grandes répteis semiaquáticos com corpo revestido por grossas escamas – foram descritas apenas seis espécies de jacarés. As outras 753 espécies são da ordem Squamata – répteis com o corpo escamado. Desse grupo, 405 espécies são de serpentes, 276, de lagartos, e 72, de anfisbenas, popularmente chamadas de cobras de duas cabeças.
Das 795 espécies descritas, quase metade é endêmica, ou seja, ocorre apenas nos ambientes naturais do território brasileiro. No caso dos jacarés, informa Costa, nenhuma espécie encontrada no Brasil é endêmica. Em relação aos cágados, seis espécies são exclusivas do país, como o cágado-de-hogei (Mesoclemmys hogei), que vive na região da bacia do Rio Paraíba do Sul e está ameaçado de extinção.
Na ordem com maior número de espécies descritas – a Squamata – são endêmicos 40% das serpentes, 53% dos lagartos e 76% das anfisbenas. “Além de concentrar importante diversidade de répteis, o Brasil possui número significativo de endemismos”, resume Henrique Costa.
Abundância
Das 27 unidades federativas, a mais rica em espécies de répteis é o Mato Grosso, com 298. Alguns fatores que influenciam a distribuição das espécies são a extensão territorial, a diversidade de biomas e o clima. “O Mato Grosso é o terceiro maior estado em área e conta com três biomas distintos, a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal. Tem clima mais quente, fisiologicamente mais propício para a sobrevivência dos répteis”, justifica Costa.
Curiosamente, estados com grandes territórios como Roraima, Piauí e Ceará têm riqueza de répteis próxima à do Distrito Federal (DF), a menor unidade federativa do país. “Isso ocorre porque são estados com grande potencial, mas com poucos estudos amostrais nessa área. Neles, ainda há muitas espécies a serem descobertas”, diz o autor do estudo.
Como identificar um réptil
Para identificar uma espécie, o taxonomista observa se as características do réptil coletado são similares às de alguma espécie já reportada pela ciência. Várias características morfológicas são analisadas: tamanho de suas estruturas anatômicas, o número, o formato e a coloração de suas escamas. Caso haja material com o DNA preservado, o pesquisador pode se valer de análises genéticas.
Os centros de pesquisas taxonômicas reúnem coleções de espécies devidamente documentadas e preservadas, além de um sistema de empréstimo colaborativo entre eles, de forma a possibilitar estudos comparativos. A UFMG participa dessa rede por meio da coleção de répteis do Centro de Coleções Taxonômicas, que reúne aproximadamente três mil exemplares.
Se confirmar que as características do animal estudado não coincidem com as de alguma espécie conhecida, o taxonomista deve descrever seus achados em artigo.
Artigo: Répteis do Brasil e suas unidades federativas: lista de espécies
Autores: Henrique Caldeira Costa e Renato Silveira Bérnils