Inovação: um olhar para fora do campus
Não há inovação sem aplicação prática. A necessidade de aferir valor – seja ele de qualquer natureza – filia-se estreitamente à noção de que, para ser validada, uma ideia ou processo novo deve satisfazer uma necessidade ou melhorar algum aspecto da vida humana. Em se tratando da academia, isso se torna um fator ainda mais importante para conduzir as discussões.
Discutir inovação é, em essência, analisar resultados. A UFMG foi classificada em 2015 como a terceira universidade por indicador de inovação, segundo o Ranking Universitário da Folha (RUF). Não obstante o reconhecido e expressivo resultado obtido, pode-se ainda identificar ferramentas, metodologias e programas acadêmicos carentes de “inovação” – principalmente quando comparados a centros acadêmicos de excelência global em empreendedorismo.
“Não se pode negar a existência de iniciativas semelhantes já implantadas no campus da UFMG. No entanto, trata-se de projetos pontuais, muito longe ainda de estarem orgânica e institucionalmente instaurados”
Grande parte do conteúdo deste artigo é fundamentada nas ideias da renomada professora Whitney Hischier**, da Universidade de Berkeley (Haas School), por mim entrevistada recentemente. Entre as valiosas contribuições, um aspecto específico – a busca de respostas fora do campus – foi repetidamente enfatizado como trunfo desta que é considerada uma das mais conceituadas universidades em empreendedorismo e inovação.
Como não poderia ser diferente, se a inovação se vincula estreitamente à aplicabilidade prática ou à satisfação de uma necessidade humana, é natural – e desejável – que a academia se valha de experiências empíricas para fundamentar e guiar suas pesquisas e inventos. Isso pode se dar de diversas formas. Na Universidade de Berkeley, os alunos são constantemente encorajados a entrevistar seus potenciais consumidores e a investigar seus anseios antes mesmo de desenvolverem o produto ou o serviço propriamente dito.
Ao ser questionada sobre as formas de instrumentalizar essa prática, a professora Hischier lembrou que sua instituição mantém vários programas e estratégias que a viabilizam. Na Haas School of Business, onde leciona, há cursos como o Startup Lab (em que os alunos reúnem-se em equipes vinculadas a uma startup durante o semestre), o International Business Development (alunos formam equipes para trabalhar com um cliente internacional), Launch (programa que estimula os estudantes a abrir empresas) e Skydeck (incubadora em que os alunos recebem infraestrutura, treinamento e coaching para dar os primeiros passos em seu próprio negócio).
Não se pode negar a existência de iniciativas semelhantes já implantadas na UFMG. No entanto, trata-se de projetos pontuais, muito longe ainda de estarem orgânica e institucionalmente instaurados, tal como se observa na Universidade de Berkeley. Ainda segundo a professora Hischier, Berkeley conta com expressivo número de parcerias com organismos públicos e empresas, a fim de prover mais elementos e recursos às suas pesquisas.
Ainda que a comparação aqui estabelecida deva ser realizada com ressalvas (o que é natural, em se tratando de ecossistemas de inovação bem diferentes), é inegável a constatação de similitudes entre as duas universidades. Entre essas aproximações no campo da inovação, destaca-se não somente a excelência acadêmica de seus professores, alunos e suas pesquisas, mas a coexistência – guardadas as devidas proporções – com um mercado extremamente dinâmico e inovador. Afinal, se a Universidade de Berkeley dispõe do SiliconValley, a UFMG aproveita-se da maior comunidade de startups da América Latina, o San Pedro Valley, que reúne mais de 200 empresas em Belo Horizonte.
Em matéria de inovação, é preciso conciliar o consolidado olhar acadêmico com uma visão prática e instrumental. Um olhar para fora do campus nunca se fez tão importante. Por isso, finalizo esta reflexão com as palavras da professora Hischier, a quem expressamente agradeço pelas valiosas contribuições:
Inovação requer sair do escritório/universidade/laboratório. Uma das principais barreiras à inovação são os grilhões entre indústrias e organizações; ao promover-se a integração de universidades, governos e empresas locais, surge naturalmente uma grande variedade de ideias e oportunidades.
*Mestrando em Direito pela UFMG. Pós-graduado em Direito Internacional pelo Centro de Direito Internacional (Cedin). Bacharel em Direito pela UFMG e advogado-sócio da Nemer Caldeira Brant Advogados Associados
**Professora na Haas School of Business, na Universidade de Berkeley. Consultora internacional e coach de startups. Atuou anteriormente como vice-diretora para educação executiva na Universidade de Berkeley e trabalhou por mais de uma década com consultoria em gestão. É graduada pela Universidade de Stanford e possui MBA pela Haas School of Business (Universidade de Berkeley).