Boletim
Pó restaurador
Um diagnóstico para o saneamento rural
Equipe da UFMG recolhe informações em 11 estados para ajudar a delinear mapa sanitário brasileiro
Desde o último dia 17, pesquisadores da UFMG estão em campo a fim de conhecer a realidade de saneamento rural em todas as regiões do país. Os dados qualitativos, somados a informações do censo demográfico, vão ajudar a delinear o mapa sanitário que servirá de base para a elaboração do Programa Nacional de Saneamento Rural (PNSR). "Feito esse diagnóstico, vamos partir para o desenvolvimento de uma matriz tecnológica que ofereça soluções para atender a diferentes escalas e realidades rurais", explica a coordenadora do trabalho, professora Sonaly Rezende, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Escola de Engenharia.
A pesquisadora destaca que as soluções apresentadas precisam ser sustentáveis a longo prazo, por isso, é também tarefa da equipe pensar mecanismos de gestão e de operação, modelos de investimento e formas de monitoramento. O Programa, que será entregue à Fundação Nacional de Saúde (Funasa) no primeiro semestre de 2017, deverá propor ações de saneamento básico para a população rural e para as comunidades tradicionais, como as indígenas e quilombolas, e as reservas extrativistas. Essas ações abrangem medidas de abastecimento de água potável, de esgotamento sanitário, de provimento de banheiros e unidades hidrossanitárias domiciliares e de educação ambiental para o saneamento, além de limpeza pública e manejo de resíduos sólidos e de águas pluviais.
Treinamento
Os 15 pesquisadores da UFMG, distribuídos em cinco equipes, estão percorrendo 11 estados: Pará, Acre, Ceará, Pernambuco, Paraíba, Bahia, Goiás, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Foram selecionadas localidades habitadas por populações quilombolas, ribeirinhas, caiçaras e atingidas por barragens. Também estão sendo contemplados assentamentos, reservas extrativistas e uma comunidade que faz coleta seletiva de resíduos sólidos, em Crateús, Ceará. Cada pesquisador visitará três localidades e passará cerca de dez dias em cada uma delas, para coletar opiniões dos moradores por meio de entrevistas individuais e rodas de conversa. A equipe também fará registros em fotografias e vídeos.
O treinamento, concluído às vésperas da viagem, incluiu preparação metodológica em antropologia aplicada à engenharia, com o pesquisador italiano Oscar Torretta, e uma série de outros aprendizados, como o uso de câmeras e atualização de bancos de imagens na internet, para garantir o registro atualizado do material coletado. "Entre os vários caminhos possíveis, optamos por trabalhar com a metodologia Grounded theory, associada à etnografia, que atende bem a uma pesquisa tão ampla, abrangendo todo o território brasileiro, com suas várias realidades culturais e geomorfológicas", comenta Torretta. A mestranda em Engenharia ambiental Jéssica Ayra Alves Silva, que seguiu para o Acre, acredita que a experiência de campo será importante para sua formação, sobretudo pelo aprendizado de uma metodologia que comporta adaptações a cada realidade local.
"Fizemos um laboratório da pesquisa, na comunidade Assentamento Rural Pastorinhas, em Brumadinho, e um experimento nas comunidades de Cardoso e Capão do Berto, em Jaboticatubas, todos na Região Metropolitana de Belo Horizonte", informa João Luiz Pena, engenheiro sanitarista e antropólogo que integra a equipe de coordenação e que, ao lado da enfermeira e mestre em saneamento Laís Santos de Magalhães Cardoso, dará suporte às equipes.
Esses territórios têm especificidades que requerem abordagem própria e distinta da convencionalmente adotada nas áreas urbanas, tanto na dimensão tecnológica quanto na da gestão e relação com as comunidades
Sonaly Rezende enfatiza que o trabalho de campo não será suficientemente representativo para traçar um perfil do saneamento rural brasileiro, por isso há a necessidade de utilizar os dados do censo. Contudo, pautados nos estudos de caso, especialistas de três eixos – tecnológico, gestão e educação e participação social – vão propor soluções para atender às necessidades de diferentes cenários. Para a professora, o empenho em elaborar o Programa Nacional de Saneamento Rural se justifica pelo significativo passivo que o país acumula na área. Embora a Organização das Nações Unidas (ONU) defina como direito humano o abastecimento de água e esgotamento sanitário, apenas 32% dos domicílios rurais brasileiros possuem redes de abastecimento de água, e somente 5,2% têm rede de coleta de esgoto, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2012.
Segundo a professora, "esses territórios têm especificidades que requerem abordagem própria e distinta da convencionalmente adotada nas áreas urbanas, tanto na dimensão tecnológica quanto na da gestão e relação com as comunidades". O Programa deverá propor intervenções necessariamente acompanhadas de medidas estruturantes, como participação da comunidade, educação ambiental para o saneamento e mecanismos de gestão e de capacitação dos atores. O PNSR é um dos desdobramentos do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), aprovado por decreto presidencial no fim de 2013.