Arte e Cultura

Malcom Ferdinand discute crise ambiental sob a ótica do legado colonial racista

Intelectual martinicano, autor de 'Uma ecologia decolonial', expõe suas ideias, nesta sexta, em debate no Festival de Verão

Malcom
Malcom Ferdinand: saídas para a “tempestade” racial e ambientalFoto: Benedicte Roscot | Divulgação

Recém-saído do prelo, o livro Uma ecologia decolonial, do engenheiro ambiental e filósofo político martinicano Malcom Ferdinand, instaurou um debate: como é possível que ainda hoje se siga discutindo o colapso ambiental vivido pelo mundo sem que se dê a devida dimensão à história colonial da geopolítica mundial, justamente ela a responsável por engendrar a condição de possibilidade de tal colapso?

Para Malcom (que nasceu na Martinica, ilha caribenha que segue ainda hoje como território francês), a destruição do meio ambiente e o legado colonial racista estão inextricavelmente ligados – seja em suas origens, seja em suas consequências atuais. E, em razão disso, defende ele, urge debater esses dois temas sem permitir sua dissociação interessada – até porque, dada essa relação, a solução para uma questão passará necessariamente pela outra.

O ambientalista estará na UFMG nesta sexta-feira, dia 3, às 16h30, para debater o assunto com o público do Festival de Verão. O encontro com Malcom, fruto de parceria do Festival de Verão UFMG com a embaixada da França no Brasil, será realizado no Conservatório UFMG (Avenida Afonso Pena, 1.534, no Centro de Belo Horizonte). O evento é aberto ao público e a palestra será ministrada em francês, com tradução para o português.

Um mundo repensado desde o Caribe
Nascido na Martinica, Malcom Ferdinand graduou-se em engenharia ambiental pela University College London (UCL), no Reino Unido, e fez doutorado em filosofia política e ciência política na Universidade Paris 7 (Université Denis Diderot), na França. Desde então, pesquisa a interação do colonialismo com a questão ambiental, com base no contexto caribenho.

Uma ecologia decolonial, de Malcom Ferdinand, tem prefácio da filósofa Angela Davis
'Uma ecologia decolonial', de Malcom Ferdinand, tem prefácio da filósofa Angela Davis Imagem: Reprodução de capa

Malcom atua como pesquisador do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), na França, e no Institut de Recherche Interdisciplinaire en Sciences Sociales (Irisso) da Universidade Paris 9 (Université Paris-Dauphine). Em Uma ecologia decolonial: pensar a partir do mundo caribenho, o ambientalista se vale da metáfora do navio para implicar mutuamente as questões do racismo e da crise ecológica – e, com base nela, propor saídas para a “tempestade” racial e ambiental em que nos encontramos.

“Náufragos, desterrados, fora-do-mundo, programados para sempre se deslocar entre a casa-grande e a senzala, negros e negras, povos originários e outras populações historicamente exploradas e marginalizadas são mais vulneráveis ao ‘habitar colonial do mundo’ instituído pelo homem branco. Além dessas vidas, o ecossistema como um todo foi sendo destruído no processo de exploração colonial da Terra e de escravização negra, processos que serviram de base para a modernidade. É preciso pensar a ‘tempestade’, portanto, a partir do ‘porão da modernidade’, do porão do navio negreiro que lhe deu origem”, anota-se na orelha do volume.

Em 2019, o livro foi premiado pela Fondation de l'Écologie Politique francesa, instituição criada em 2012 para colaborar na luta por uma relação mais saudável do homem com a natureza. No prefácio da obra, a filósofa estadunidense Angela Davis demarca a importância do volume para as lutas progressistas ao redor do mundo. “Este é um livro que eu gostaria de ter lido anos atrás, especialmente quando tentava compreender as inter-relacionalidades de gênero, raça e classe”, registrou.

Para Davis, o ambientalista acerta ao situar o racismo como aspecto central e plural no âmbito da crise ambiental. “Ferdinand solicita não apenas que reconheçamos o papel que o racismo desempenha na definição de quem está mais vulnerável à poluição ambiental, mas também – e sobretudo – como o racismo, especificamente o colonialismo e a escravidão, ajudou a construir um mundo fundamentado na destruição ambiental. Em outras palavras, o racismo não adentra o cenário simplesmente como fator determinante da maneira como os perigos ambientais são vividos de forma desigual pelos seres humanos, ele cria as próprias condições de possibilidade de ataques contínuos ao meio ambiente, inclusive aos animais humanos e não humanos, cujas vidas são sempre desvalorizadas pelo racismo, pelo patriarcado e pelo especismo.”

Livro: Uma ecologia decolonial – pensar a partir do mundo caribenho
Autor: Malcom Ferdinand
Editora: Ubu
320 páginas / R$ 89,90

Evento: sexta-feira, dia 3, às 16h30, no Conservatório UFMG
Endereço: Avenida Afonso Pena, 1.534, Centro, Belo Horizonte

Ewerton Martins Ribeiro