Entrevista/Leonor Gonçalves
“Precisamos criar ambientes para estimular a permanência das novas gerações”
Servidores públicos com diferentes perfis dividem hoje os espaços de trabalho na Universidade, trazendo aos gestores o desafio de adotar práticas que minimizem conflitos e valorizem o potencial de cada grupo, evitando prejuízos aos processos.
Nesta entrevista ao BOLETIM, a pró-reitora adjunta de Recursos Humanos, Leonor Gonçalves, discorre sobre os fatores que levaram a essa situação inédita e fala da expectativa de que a Semana do Servidor e o mestrado profissionalizante em Gestão Pública sejam ambientes para reflexão e elaboração de soluções para esse novo cenário vivido pela Instituição.
A que se pode atribuir a grande renovação no quadro de pessoal que a UFMG vive hoje?
Alguns fatores contribuem para que a UFMG tenha, pela primeira vez na sua história, uma composição do quadro com grande contingente de servidores se aposentando e outro começando a carreira. Cerca de 30% dos atuais servidores técnico-administrativos estão saindo agora, pois entraram há cerca de três décadas. Mudanças no direito público, como a proposta de extinção do abono permanência, estimulam essa saída. Antes de 2010, tínhamos que aguardar autorização do Governo Federal para repor as vagas, e muitas eram canceladas. De lá para cá, houve reposições paulatinas, mas em 2015 atingimos um período de substituição daqueles que entraram há 30 ou 35 anos, por isso haverá grande contingente de saída e de entrada – só por esse último concurso entrarão 200 novos servidores técnico-administrativos. Também chegarão 200 docentes.
A mudança na legislação também afeta o comportamento dos servidores recém-concursados?
Completamente. Com o fim da aposentadoria integral, o novo servidor sabe que vai se aposentar pelo teto da previdência, por isso, já não entra com aquela perspectiva de construção de futuro na universidade. Se ele tiver novas oportunidades, vai buscá-las. Nossos salários não são os melhores do serviço público, e todos os que passam nos concursos são excelentes, do ponto de vista de habilidades, também para outros concursos. Assim, sempre teremos servidores vislumbrando oportunidades melhores lá fora e não numa carreira interna, devido à quebra do Regime Jurídico Único no aspecto da garantia de futuro, diferentemente dessa geração que hoje está saindo. Essa é uma nova realidade, com a qual a iniciativa privada já lida.
Quais os resultados práticos dessa nova configuração?
Corremos o risco de perder a memória da Universidade e comprometer processos. Se não prepararmos quem está chegando, essas pessoas vão levar mais tempo para aprender, o que pode prejudicar as atividades.
Que tipo de conflito de gerações tem ocorrido?
Em algumas unidades, os diretores estão montando setores só com jovens e outros só com antigos, para evitar o choque de convivência das gerações. Em geral, o servidor antigo não quer ensinar, porque sente resistência do jovem, e este fala que o antigo quer mandar, pensa que não tem o que aprender com quem está saindo. Entre os professores, os novos também se queixam muitas vezes de serem excluídos porque chegam interessados em se desenvolver, mas se sentem barrados pelos antigos. É fundamental adotarmos outro olhar para a questão e compreender o perfil dos novos servidores.
De que modo?
É uma nova geração que vive uma realidade imposta a ela, com a modificação dos direitos. No caso da minha geração foi diferente: quando entrei na UFMG, em 1982, eu sabia que iria permanecer aqui até me aposentar. Construí um projeto de vida com a Universidade; aqui desenvolvi meu trabalho, me especializei, fiz mestrado, doutorado, e fiz gestão nesse processo da minha vida e do trabalho. A geração que chega vai fazer a gestão por tempos. E temos de criar ambientes que estimulem essas pessoas a permanecer, porque o pertencimento não se constrói só pelo salário, está relacionado também à satisfação no trabalho. Temos de recebê-las de modo que se sintam integradas ao ambiente e não expurgadas. Certamente, os servidores recém-admitidos têm muito a contribuir em termos de inovação, e a geração mais antiga também tem muito a repassar para esse novo grupo. As pessoas têm o direito de buscar novos horizontes, e a UFMG, como instituição pública, precisa investir nelas, inclusive para que saiam mais bem preparadas para outras instituições. Assim, a Universidade vai se transformar em formadora dessas pessoas. O grande problema é como conviver com isso sem quebras contínuas, porque ocorrerão entradas e saídas frequentes. É preciso focar na formação desses servidores, sem deixar os processos se desatualizarem. Teremos de trabalhar muito em construção de protocolos de trabalho, muito bem descritos e atualizados, que minimizem prejuízos.
O que a Universidade espera alcançar ao trazer esse tema para discussão durante a Semana do Servidor?
Já existem estudos nas relações privadas sobre esse problema, mas não dentro das instituições públicas de ensino. Trouxemos essa discussão para o nosso ambiente porque precisamos assumir que o problema existe e que devemos aprender a lidar com ele. Não estamos habituados a sentar e discutir os conflitos. Isso exige tempo, abertura para o diálogo e para a negociação. Precisamos aprender a preparar os gestores para lidar com conflito. Nossa expectativa é de que o mestrado profissionalizante em Gestão Pública que a UFMG vai oferecer seja uma porta para lidar com essa questão. Esperamos que os servidores busquem, por meio desse curso, elaborar soluções para seus ambientes.