Brumadinho, um ano depois: e o futuro?
Programa 'Outra estação' reúne depoimentos de atingidos pelo rompimento da barragem da Vale, faz balanço das investigações e apresenta perspectivas de recuperação do município
Neste sábado, 25, completa-se um ano do rompimento da barragem B1, da mineradora Vale, na mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho. Oficialmente, 259 mortes foram confirmadas: 123 funcionários da empresa, 117 trabalhadores terceirizados e 19 moradores e visitantes da região. Outras duas mortes são contabilizadas pela Associação das Vítimas e Atingidos no Desastre de Brumadinho (Avabrum), já que duas mulheres estavam grávidas. O Corpo de Bombeiros continua as buscas por 11 desaparecidos.
O programa Outra estação apresenta depoimentos de pessoas que tentam recomeçar a vida depois da tragédia – algumas ainda aguardam reparação, enquanto outras nem mesmo foram reconhecidas como atingidas. Autoridades também foram ouvidas, para fazer um balanço das investigações e das medidas tomadas em resposta à tragédia.
A pró-reitora de Extensão da UFMG, Cláudia Mayorga, fala sobre a determinação da Justiça para que a Universidade atue como perita no caso e conduza pesquisas para amenizar os danos decorrentes do desastre. As ações previstas vão da fiscalização da qualidade da água do Rio Paraopeba a projetos de reparação ambiental.
Preocupação com a água
No primeiro bloco do programa, a agricultora Soraia Campos, moradora do Parque da Cachoeira, uma das regiões diretamente atingidas pelo rompimento da barragem, fala sobre a dificuldade da família em retomar as atividades, mesmo depois de receber indenização. "Eu vou ter que provar que é uma verdura limpa, uma verdura sadia, porque as pessoas de fora não estão confiando na água de Brumadinho", diz.
Indígenas da aldeia Naô Xohã, em São Joaquim de Bicas, município vizinho a Brumadinho, contam como a contaminação do Paraopeba afetou o cotidiano da comunidade e até mesmo seus rituais.
"Nossas crianças ficavam à vontade, iam para o rio, direto, tomar banho. E agora nós não podemos", lamenta Tanara, uma das lideranças locais.
O coordenador do Projeto Manuelzão, da Faculdade de Medicina da UFMG, Marcos Polignano, ressalta que o processo de contaminação da água ainda não foi interrompido. "Cada vez que cai, a água da chuva revolve o sedimento depositado ao longo do rio. Toda vez que isso acontece, os metais pesados ficam na superfície", explica.
No segundo bloco do programa, são apresentados resultados das comissões parlamentares de inquérito (CPIs) instaladas na Assembleia Legislativa de Minas Gerais e no Congresso Nacional, além de balanço das investigações conduzidas pela Polícia Civil e pela Polícia Federal. No dia 21 de janeiro, o Ministério Público de Minas Gerais apresentou denúncia à 2ª Vara Criminal de Brumadinho, em que acusa 16 pessoas, funcionários da Vale e da Tüv Süd, consultoria alemã que emitiu o laudo de estabilidade da barragem, por homicídios dolosos duplamente qualificados. As duas empresas também foram denunciadas por diversos crimes ambientais.
UFMG como perita
Diante da complexidade dos procedimentos de investigação instaurados e da tramitação do processo judicial, que reúne mais de 20 mil páginas, a UFMG será responsável pela criação de uma plataforma on-line para centralizar as informações, com linguagem acessível ao público, como informa a pró-reitora de Extensão, Cláudia Mayorga.
A medida atende a uma determinação da 6ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Autarquias, em Belo Horizonte, onde se concentram as ações judiciais sobre o desastre. O Juízo determinou que a mineradora Vale repasse para a UFMG o valor estimado de R$ 50 milhões. O recurso será usado inicialmente na realização de pesquisas aplicadas à reparação dos danos decorrentes do desastre.
Um dos objetivos da determinação judicial é evitar que se repita o modelo da Fundação Renova, criada para coordenar as ações de reparação depois da tragédia de Mariana, em 2015, e mantida pelas próprias mineradoras que operavam a barragem de Fundão. "Cabe à Universidade possibilitar o espaço de reflexão crítica. Muitas vezes, infelizmente, a população tem acesso muito limitado a esse conjunto de informações", afirma a pró-reitora.
Cláudia Mayorga lembra que a mobilização da UFMG foi intensa, desde o dia seguinte à tragédia de Brumadinho, dando continuidade às ações já realizadas pelo Projeto Participa, criado após o rompimento da barragem de Mariana. Ela cita o grupo Polos de Cidadania, que deu apoio jurídico aos atingidos, desde o princípio. "Também tivemos ações vinculadas ao Hospital das Clínicas, ao Hospital Risoleta Neves e ao Hospital Veterinário. A Escola de Veterinária teve protagonismo muito importante no salvamento dos animais", diz ela, citando ações conduzidas pela instituição.
Para saber mais
Ação Civil Pública - Ministério Público de Minas Gerais
Manifesto do Gabinete de Crise – Sociedade Civil
Relatório da CPI de Brumadinho na Assembleia Legislativa de Minas Gerais
Relatório da CPI de Brumadinho na Câmara dos Deputados
Relatório da CPI de Brumadinho e outras barragens no Senado Federal
Revista Manuelzão – edição de dezembro/2019
Produção
O episódio 26 do programa Outra estação teve apresentação de Alessandra Ribeiro, produção de Alessandra Ribeiro, Arthur Bugre e Camila Meira e colaboração de Beatriz Kalil e Breno Benevides. A edição e a coordenação de jornalismo são de Paula Alkmim, e os trabalhos técnicos, de Breno Rodrigues.
O programa aborda, semanalmente, um tema de interesse social. Na Rádio UFMG Educativa (frequência 104,5 FM), vai ao ar às quintas-feiras, às 18h, com reprise às sextas, às 7h30. O programa também está disponível nos aplicativos de podcast.
Outro programa da Rádio UFMG Educativa, o Conexões, que foi ao ar nesta sexta-feira, dia 24, também é dedicado às repercussões do rompimento da barragem em Brumadinho.