Reparações de injustiças contra o povo krenak são defendidas em encontro na UFMG
Erehé. Com essa saudação indígena, e fazendo gesto com as mãos indicando luta, Douglas Krenak, uma das lideranças indígenas em Minas Gerais, participou da mesa de abertura do evento Um ano de contaminação do Rio Doce e um século de luta Krenak, realizado nesta segunda-feira, 7, no auditório da Reitoria.
“Meu povo veio aqui para receber um pedido de desculpas do estado de Minas Gerais por tudo o que já aconteceu. O crime de Mariana tem um ano, mas meu povo já sofre há mais de 200 anos, quando Dom João VI nos declarou guerra', lembrou Douglas Krenak.
No último sábado, 5 de novembro, o rompimento da Barragem de Fundão, no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, completou um ano. O maior desastre tecnológico e socioambiental da história brasileira foi responsável pela contaminação da Bacia do Rio Doce, causando prejuízos à fauna, à flora, às cidades e às comunidades que vivem às margens do rio, incluindo os indígenas que mantinham com ele uma relação permeada de sentidos.
Aliança
O procurador do Ministério Público Federal Edmundo Dias avaliou o evento como “uma aliança do setor acadêmico com os povos indígenas". Ele também relatou parte da história do povo indígena marcada por intensos conflitos de terras. Desde a década de 1910, os Krenak sofreram com a construção da linha férrea que corta seu território e foram considerados obstáculos ao desenvolvimento brasileiro. Já na ditadura militar tiveram seus direitos violados com a criação do Reformatório Krenak, em 1969. “Para lá eram encaminhados indígenas que 'opunham resistência' ou eram considerados desajustados sociais. O presídio era ambiente de recorrentes casos de torturas, trabalhos forçados, desaparecimentos e extermínios”, revelou.
O representante da Comissão Estadual da Verdade, Paulo Afonso Moreira, discorreu sobre as atribuições do órgão. “A missão da Comissão de Verdade é mapear locais onde ocorreram essas violações durante a ditadura militar e buscar fazer reparações, não só no sentido material, mas, principalmente, no imaterial".
O secretário de Direitos Humanos de Minas Gerais, Nilmário Miranda, disse que não somente os Krenak, mas todos os povos indígenas, foram afetados pela ditadura militar e receberão oficialmente do governo um pedido de desculpas. “Eu assumo, em nome do atual governo, que, a partir do relatório da Covemg, vamos trabalhar para reparação a dos povos indígenas, mas também é necessária a reparação do governo federal, que durante a ditadura foi o principal responsável pelo sofrimento de indígenas em todo o território nacional. Não podemos fazer um pedido de desculpas sem medidas efetivas". enfatizou.
Um das responsáveis pela organização do evento na UFMG, a pró-reitora adjunta de Extensão, Claudia Mayorga, também avaliou como fundamental o pedido formal de desculpas à etnia. "Vamos esperar o desdobramento do compromisso firmado pelo secretário Nilmário Miranda", disse ela.
A vice-reitora da UFMG, Sandra Goulart Almeida, definiu o encontro como um ato de reflexão e 'comemoração', "no sentido de trazer à memória, fazer recordar e lembrar. Jamais podemos esquecer o desastre de Mariana, a luta Krenak e a ditadura militar”, disse ela, que cedeu a Douglas Krenak a prerrogativa de encerrar a cerimônia.
“O que buscamos é o respeito como seres humanos, pois, antes de sermos indígenas, somos humanos", disse Douglas. Ele aproveitou a cerimônia para reivindicar do secretário Nilmário Miranda, "que se mostrou aliado das lutas indígenas", a doação de terras onde fica a caverna dos Sete Salões, que abriga pinturas rupestres feitas por antepassados dos krenaks. A área integra parque estadual do mesmo nome.
O evento foi organizado pela Pró-Reitoria de Extensão, em parceria com a Clínica de Direitos Humanos, e compõe as atividades do programa Participa UFMG e do Observatório Interinstitucional do Desastre Mariana-Rio Doce.