Ana Estela Haddad visita UFMG em busca de apoio para promover revolução digital no SUS
A secretária do Ministério da Saúde reuniu-se com gestores e especialistas da Universidade para debater uso da tecnologia – em particular, a IA – na gestão de dados e sua transformação em informação
Ana Estela Haddad, secretária de informação e saúde digital do Ministério da Saúde, reuniu-se com a reitora da UFMG Sandra Regina Goulart Almeida em seu gabinete na tarde desta quarta-feira, 20 de setembro, para debater e pensar novas formas de a Universidade colaborar com o governo federal na gestão digital das informações do Sistema Único de Saúde (SUS). “Foi uma reunião excelente; estamos saindo daqui com muitos encaminhamentos”, disse a secretária, ao final do encontro [confira uma entrevista com Estela Haddad mais à frente nesta mesma matéria].
Entre as hipóteses cogitadas, falou-se na possibilidade de se criar, na UFMG, algum tipo de formação em saúde digital – eventualmente, uma formação transversal, para colaborar com as demandas do ministério. “Coloquei-nos à disposição para ajudar no que for possível. Esta é uma área forte nossa, em que já temos bastante coisa desenvolvida”, disse a reitora, lembrando o destacado trabalho de gestão de informação digital que a UFMG teve durante a pandemia. “Fomos um modelo no monitoramento da covid”, lembrou. Por fim, a reitora ainda se colocou à disposição para colaborar na interlocução entre as instâncias de saúde do governo federal e do governo estadual, dada o bom diálogo que a Universidade tem nas duas esferas.
O tema recorrente da reunião – e da série de painéis de que a secretária participou, na UFMG, no período da manhã – foi o avanço das tecnologias de inteligência artificial (IA) e seu potencial de colaborar na difícil gestão do imenso universo de dados que é produzido pela ampla e pervasiva estrutura de saúde do país. Em razão da especificidade da pauta, a reitora esteve acompanhada, na reunião, de Fernando dos Reis, pró-reitor de Pesquisa da UFMG, e de alguns dos principais nomes da articulação que é feita, na Universidade, dos campos da saúde e da tecnologia, que puderam debater com a secretária ideias e soluções.
Participaram a professora da Faculdade de Medicina Mariangela Cherchiglia, especialista em saúde pública; o professor do Departamento de Ciência da Computação Wagner Meira, referência no campo da mineração de dados e da segurança e governança eletrônica da informação; a professora da Escola de Enfermagem Deborah Carvalho Malta, recentemente apontada como a segunda cientista mais produtiva do Brasil e uma entre as mil cientistas mais importantes do mundo; o professor do Departamento de Ciência da Computação Virgílio Almeida, um dos principais especialistas em inteligência artificial do país, recentemente agraciado com o Prêmio FCW de Ciência de 2023; e o professor da Faculdade de Medicina Antonio Luiz Pinho Ribeiro, que coordena a Rede de Teleassistência de Minas Gerais e do Centro de Telessaúde do Hospital das Clínicas (HC) da UFMG.
Virgílio e Antônio Luiz são o pesquisador responsável e o vice-diretor do Centro de Inovação em Inteligência Artificial para a Saúde (CIIA-Saúde), que esteve no foco das atenções da secretária em sua visita à UFMG. O CIIA-Saúde é um centro de pesquisa e desenvolvimento de soluções avançadas de inteligência artificial para a saúde. Seu objetivo é otimizar a atenção à saúde da população no Brasil – para isso, desenvolve soluções capazes de auxiliar os profissionais de saúde no diagnóstico e no tratamento de doenças. Além disso, o CIIA atua na orientação dos gestores de saúde na programação de ações de prevenção e de organização da assistência à saúde – daí o interesse da secretária em sua estrutura. Na entrevista abaixo, Ana Estela detalha as razões da sua visita, lista os desafios que a sua secretaria tem pela frente e fala das suas expectativas de realização para o ciclo de gestão que se iniciou neste ano no país.
Entrevista com Ana Estela Haddad
Secretária, qual foi o seu principal objetivo com esta visita?
Ana Estela: Ultimamente, houve uma série de inovações e de investimentos feitos na área de tecnologias emergentes, como a inteligência artificial, a telessaúde, a saúde digital. Meu objetivo foi tratar de aspectos da saúde digital, que é área em que estamos trabalhando agora. A UFMG é uma parceira de longa data nossa de várias políticas de saúde ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS). É uma Universidade que tem longo histórico nos seus cursos de saúde, um histórico de trabalhar e fazer pesquisa e ensino de forma integrada à rede do SUS. No decorrer do dia, pude conhecer uma série de projetos de pesquisa e inovação, e também na vertente do ensino e da extensão, que são fundamentalmente projetos inovadores – projetos que fazem sentido e que podem fortalecer o caminho da transformação digital que a gente está construindo no SUS.
Que caminho é esse, e de que projetos estamos falando?
Ana Estela: Estamos falando de ações mais estruturantes, como, por exemplo, o caso do Centro de Inovação em Inteligência Artificial para a Saúde (CIIA-Saúde), que está propondo um modelo para a gente trabalhar dados abertos para pesquisa. É um dos temas de que a gente está cuidando. Nossa ideia é trabalhar um modelo de governança de dados que nos permita compreender e tratar os dados como um bem público – isto é, um bem que possa produzir informação relevante para a tomada de decisão clínica, a tomada de decisão dos profissionais de saúde; para a tomada de decisão da gestão; e para a saúde da população. Estamos falando, portanto, de perfil epidemiológico, de ações de vigilância, mas também de dados para a informação dos próprios pacientes; informações para que as pessoas possam tomar melhores decisões para cuidar bem da sua saúde.
Qual é o tamanho desse desafio?
Ana Estela: Hoje a gente sabe o quão importante é ter dados, mas não adianta a gente ter os dados só armazenados. A gente precisa ter capacidade analítica, a gente precisa pensar na questão de segurança. Dados da saúde são dados sensíveis. Foram desses aspectos que a gente tratou em nossa reunião. Além de ter um corpo docente extremamente qualificado, a UFMG tem uma ação interdisciplinar. Em um laboratório da Ciência da Computação, por exemplo, há docentes da computação, da engenharia, da medicina e de outras áreas da saúde trabalhando juntos, com pesquisa de ponta [disse lembrando o trabalho desenvolvido no CIIA-Saúde]. Então é nisso que estamos interessados. Nesse sentido, foi uma visita muito profícua, de que eu saio muito feliz e entusiasmada. Nossas discussões abriram possibilidades de mais projetos além dos que a gente já está realizando em conjunto.
Responsável por formular políticas públicas orientadoras para a gestão da saúde digital, a Secretaria de Informação e Saúde Digital foi criada no início do ano, agregando o termo “informação” ao nome de secretaria já existente em gestões anteriores. Quais são as suas metas no cargo?
O Ministério da Saúde já trabalha há algum tempo com ações de telessaúde, tem uma política de informática em saúde, mas essas ações estão distribuídas por diferentes espaços. No fim do ano passado, na transição do governo, momento em que foi feito um amplo levantamento de dados e uma análise aprofundada da situação, o grupo de que participou a ministra da saúde Nísia Trindade – que contou com quatro ex-ministros da saúde – chegou à conclusão de que era necessário criar uma secretaria que fosse não só de saúde digital, mas de informação, pois a informação é o primeiro passo estruturante. Digo isso porque a gente tem o DATASUS [departamento de informática do SUS], o Departamento de Monitoramento, Avaliação e Disseminação de Informações Estratégicas em Saúde (Demas) [onde são trabalhados os indicadores e a capacidade analítica sobre os bancos de dados] e o Departamento de Saúde Digital e Inovação, mas precisamos melhorar a interoperabilidade de dados [entre essas instâncias]. Precisamos preparar esses bancos de dados para haver inteligência de dados, capacidade analítica: fazer com que os dados [articulados entre si] possam gerar informações para o SUS. São informações que vão para a decisão clínica, para a gestão e vigilância, para a predição para novas emergências sanitárias; informações capazes de evitar que, no futuro, a gente esteja despreparado como estávamos quando chegou a pandemia de covid. Então é a meta é essa, fazer da informação uma questão estruturante e estratégica.
Desafios...
Isso tem imensos desafios, claro, pois a informação é produzida em diferentes lugares: nas atividades clínicas, nas atividades de vigilância... são muitas pessoas, muitos atores que alimentam e registram essas informações. A rede é muito grande. São 123 mil estabelecimentos de saúde; cada estabelecimento de saúde tem dois operadores do sistema, então são 246 mil operadores. Nesse sentido, para as informações terem integridade, para haver qualidade do dado em todo o processo de coleta, registro e tratamento, é preciso haver essa organização – um modelo informacional, um modelo computacional para que se possa gerir a informação. E aí entram então a telessaúde, por exemplo, e o prontuário eletrônico do paciente, que será muito importante para que se possa ter uma continuidade da linha de cuidado. O ConecteSUS, por exemplo: a ideia é que tenha a informação clínica, de modo que o próprio paciente possa ter seu prontuário em qualquer ponto da rede no país. Se a gente conseguir integrar as redes municipais e estaduais com a rede nacional de dados em saúde – este é o nosso modelo de interoperabilidade –, aí o paciente vai ter acesso ao ConecteSUS aonde ele for.
Estamos falando de uma inovação que pode resultar em redução de custos e eliminação de redundâncias?
Exatamente. E em melhora da qualidade da atenção em saúde. Então esse é o nosso desafio: fazer a transformação digital, melhorar a qualidade com esses elementos: informação, prontuário eletrônico, telessaúde.
Visita ao CIIA-Saúde
Pesquisadores do Departamento de Ciência da Computação (DCC), da Escola de Enfermagem, da Faculdade de Medicina e do Hospital das Clínicas (HC) da UFMG receberam, hoje pela manhã, a visita de Ana Estela Haddad. Eles apresentaram à secretária as pesquisas realizadas no âmbito do Centro de Inovação em Inteligência Artificial para a Saúde (CIIA-Saúde), sediado na UFMG, que desenvolve soluções avançadas de inteligência artificial (IA) capazes de auxiliar profissionais de saúde no diagnóstico e tratamento de doenças, além de orientar gestores de saúde na programação de ações de prevenção e organização da assistência à saúde.
Ana Estela ouviu sobre as pesquisas sobre saúde digital e IA, telessaúde e IA, carga de doença e telemonitoramento, educação em saúde digital e conheceu o núcleo de inteligência artificial do Centro. Segundo o professor Virgílio Almeida, professor emérito da UFMG e pesquisador responsável pelo CIIA-Saúde, a visita deve gerar parcerias promissoras com o Ministério da Saúde. “Nosso objetivo, além de apresentar o Centro e todos os avanços em pesquisas de impacto para a sociedade que já conseguimos desde a sua criação, é estreitar laços e promover esforços conjuntos para ampliar o progresso do projeto”, afirmou.
Professora do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina e coordenadora de Educação e Difusão do Conhecimento do CIAA-Saúde, Zilma Reis abordou avanços no que diz respeito à promoção da educação entre profissionais e estudantes da área de saúde. “Hoje integramos disciplinas na formação dos nossos médicos que convergem com os avanços que já obtivemos por meio das pesquisas promovidas no Centro. O Educa e-Sus APS, por exemplo, é uma plataforma de cursos para treinamento massivo e aberto. Temos o objetivo de alcançar cada vez mais profissionais e estudantes com oferta de educação permanente em saúde digital para a Atenção Primária à Saúde”, destacou.
Ana Estela Haddad disse que o encontro foi muito enriquecedor e reafirmou a importância das pesquisas realizadas nas universidades para o desenvolvimento e cuidado com a sociedade brasileira. “Este Centro, seus pesquisadores e todas as pesquisas construídas até agora são uma inspiração. Queremos a participação e colaboração de todos na construção de políticas públicas que sejam efetivas e que promovam o bem-estar e a saúde da população”, afirmou.
Além de Virgílio Almeida e Zilma Reis, participaram do encontro Wagner Meira Júnior, Ana Paula Couto Silva, Fabiana Peixoto, Letícia Neto (todos do DCC), Deborah Malta (Escola de Enfermagem), Mariângela Cherchiglia, Laís Cardoso (ambas da Faculdade de Medicina), Antônio Ribeiro, Cristina Paixão, Luisa Brant e Clara Alves, do Hospital das Clínicas. Também estiveram presentes o pró-reitor de Pesquisa da UFMG, Fernando Reis, o diretor do Instituto de Ciências Exatas, Francisco Dutenhefner, e o vice-chefe do DCC, Heitor Soares Ramos Filho.