Cármen Lúcia: ‘A informação correta nos forma e possibilita que nos transformemos’
Ministra do STF falou em evento que encerrou jornada sobre projetos acadêmicos de combate à desinformação e defesa da democracia
O que fazer nesses tempos de desinformação, de mentiras planejadas e monetarizadas? Precisamos reafirmar a importância da informação correta, que nos forma e possibilita que nos transformemos”, afirmou a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), durante evento na tarde de hoje (sexta, 28 de abril), no auditório da Reitoria da UFMG. O encontro encerrou a 1ª Jornada do Programa UFMG de Formação Cidadã em Defesa da Democracia.
Criado em resposta a um chamado do STF às instituições e à sociedade civil, o programa tem mobilizado a comunidade da UFMG, e mais de duas dezenas de projetos de ensino, pesquisa e extensão dedicados ao combate à desinformação, em diversas áreas do conhecimento, já se engajaram. Na quinta e na sexta-feira, os coordenadores apresentaram as iniciativas e resultados parciais.
“Os projetos apresentados nesta jornada demonstram a preocupação da UFMG com a defesa incondicional dos valores democráticos, afirmou a reitora Sandra Regina Goulart Almeida. Esperamos que outros se juntem a eles, formando um movimento robusto de formação cidadã pela democracia neste momento em que ela está ameaçada em diversas partes do mundo. A democracia precisa de nós, e nós precisamos dela, para a construção e um país mais justo e equânime, capaz de garantir o bem-estar de todo o seu povo.”
'Cidadania faz milagre'
Após homenagear a UFMG pela pronta adesão à iniciativa do STF de combate à desinformação, a ministra Cármen Lúcia enfatizou que “a democracia tem a ver com a vida de cada um de nós” e que defendê-la “não é tarefa simples nem facultativa”. Segundo ela, “cada pessoa deve ser capaz de ser livre e gostar de ser livre”.
Ela lembrou que o Brasil saiu de ditaduras algumas vezes e que “estamos ainda aqui, capazes de resistir e nos reconstruir”. Segundo a ministra, quem pede a volta da ditadura está falando de “ser amarrado e amordaçado, de renunciar à ideia de ser livre”.
Cármen Lúcia exaltou a cidadania. “A Constituição define a democracia, mas não faz milagre. As leis propiciam as condições para a cidadania, e a cidadania, sim, faz milagre”, afirmou.
Para ela, a verdade dos fatos, da ciência e do conhecimento adquirido não pode ser negada. “Negar essa verdade é negar a trajetória da humanidade neste planeta. E cultivar a desinformação é promover uma nova forma de escravidão, por meio do domínio da mente, do domínio por dentro. Como combater isso, se as pessoas querem acreditar e alegam que estão exercendo sua liberdade? Só com informação correta será possível dar a oportunidade de as pessoas decidirem de forma diferente”, argumentou a ministra do STF, que se formou na Faculdade de Direito da UFMG.
Democracia pressionada por novas demandas
A reitora Sandra Goulart Almeida observou que o fenômeno da desinformação é um grande desafio na luta em defesa da democracia e da cidadania. E ressaltou que a democracia é a base de dimensões que compõem o ethos da comunidade da UFMG, como a liberdade de cátedra e de manifestação do pensamento, a autonomia universitária e o respeito incondicional ao Estado de Direito.
“Uma sociedade democrática é baseada em eleições livres, alternância de poder e liberdade de expressão, mas a democracia tem sido pressionada por novas demandas, como a regulação das mídias sociais, o respeito aos povos originários e à população negra e ampliação das participação das mulheres em espaços decisórios. Para o exercício da democracia, é preciso também construir instrumentos que abram espaço de escuta para grupos historicamente alijados e que combatam a desigualdade social”, afirmou Sandra.
A reitora Sandra Goulart, a ministra Cármen Lúcia e a professora Geane Alzamora, coordenadora de um dos projetos que compõem o programa, falaram à TV UFMG. Assista:
Articulação
Coordenadora do comitê de acompanhamento do Programa de Formação Cidadã em Defesa da Democracia, a professora Fábia Lima contou que a jornada reuniu, nos dois últimos dias, pesquisadores e estudantes “muito engajados e entusiasmados” para discutir o tema da desinformação. “E, mais que isso, para que possamos pensar estratégias de articulação com o objetivo de, como universidade, enfrentar de forma cada vez mais efetiva as mazelas sociais provocadas pela desinformação, pelo negacionismo científico e pelos discursos de ódio”, ela disse.
Segundo Fábia, nesse primeiro momento já surgiram várias ideias de ações conjuntas, em perspectiva interdisciplinar. “Já temos uma dimensão do quanto há para aprender e para colaborar uns com os outros, em discussões que vão muito além de temas centrais como a própria democracia e o sistema eleitoral, os algoritmos e a regulação do mundo digital, apenas alguns dos tópicos tratados ontem e hoje”, relatou a professora, que dirige o Centro de Comunicação (Cedecom ) da UFMG.
Fábia Lima anunciou outras frentes de trabalho conectadas com o programa, como uma parceria com a Receita Federal para destinação sustentável de mercadorias apreendidas, em benefício da educação midiática nas escolas, a viabilização de editais de fomento direcionados a projetos de combate à desinformação e a criação de um curso de extensão para capacitação audiovisual em divulgação científica.
Além da reitora Sandra Goulart Almeida, da ministra Cármen Lúcia e da professora Fábia lima, compuseram a mesa solene do evento a presidente do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, Mônica Sifuentes, o chefe da Procuradoria Regional e Federal da 6ª Região, Gustavo Rosa da Silva, a reitora da UFMG na gestão 2002-2006, Ana Lúcia Gazzola, o reitor na gestão 2006-2010, Ronaldo Pena, o presidente do Instituto dos Advogados do Brasil, Felipe Martins, que é professor da Faculdade de Direito da UFMG, e o vice-reitor Alessandro Moreira.