Fundepar celebra primeira década e apresenta fundo de investimentos com impacto social
Programa da Fundep para investimentos em negócios de impacto é destinado a empresas de base acadêmica alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU
A Fundep Participações S/A (Fundepar), empresa de investimento em negócios de alto impacto da Fundação de Apoio da UFMG (Fundep/UFMG), lançou ontem o Programa Fundep de Investimento de Negócios de Impacto, destinado a empresas e iniciativas capazes de promover impacto positivo na sociedade, focadas na solução de problemas sociais e alinhadas com pelo menos um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
O lançamento integra as comemorações dos 10 anos da empresa, que recebeu acionistas, gestores, empreendedores, financiadores e demais atores do sistema de ciência, tecnologia e inovação para discutir o papel do empreendedorismo em CT&I. No evento, ocorrido no campus Pampulha, os gestores da Fundepar apresentaram o desempenho dos programas desenvolvidos na década. Foram 57 empresas investidas no período, com R$ 80 milhões sob gestão da Fundepar.
A tese que dá base ao novo fundo é a de que, no escopo das ciências sociais, humanas, linguística, artes, educação e áreas afins, há projetos acadêmicos, como lembrou o presidente da Fundep, Jaime Ramírez, que podem gerar tecnologias sociais e empresas capazes de inovar no enfrentamento das mazelas da sociedade. “Essas empresas precisam de investimento para os seus momentos iniciais, que são os mais difíceis”, disse.
As áreas prioritárias de investimento do programa lançado ontem são moradia e mobilidade urbana, saúde, educação, mudança climática, economia criativa, transformação digital e redução do impacto ambiental, acesso à justiça e defesa da democracia. O novo fundo se junta ao Seed4Science na carteira da Fundepar.
Conexão entre Universidade e sociedade
Ao relembrar a criação da Fundepar, em 2013, o atual presidente do Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-Tec), Marco Aurélio Crocco, que à época era o presidente da Fundep, afirmou que o objetivo não era nem suprir a falta de um fundo de investimento para empresas de base tecnológica, “que existem aos montes”, nem “alavancar recursos para a Fundep por meio da participação em um unicórnio qualquer”. Segundo ele, a Fundepar foi criada com a missão de contribuir para que a Universidade transfira o conhecimento produzido para a sociedade, “atuando sobre a desconfiança que mercado e Universidade têm um do outro”.
À época integrante do conselho curador da Fundep, a reitora da UFMG, Sandra Goulart Almeida, lembrou a hesitação do colegiado em aprovar a criação da Fundepar. “Para nós, era difícil conceber uma empresa de investimentos como parte da missão da Fundep. Por fim, fomos convencidos de que era necessária uma atuação profissional na conexão entre Universidade e sociedade, com benefício para ambos”, lembrou.
A reitora afirmou que a Fundepar está aproveitando a data para “renascer, inovar e investir em um tipo de tecnologia – a social – que também é uma fortaleza da Universidade, cada vez mais próxima à sociedade, cada vez mais preocupada em responder aos problemas sociais”.
O diretor-executivo da Fundepar, Carlos Lopes, disse que é necessário expandir a compreensão do que seja empreendedorismo. “O vocábulo empreendedor tem sido empregado de forma reducionista, em associação a empresas e premissas de maximização do lucro aos acionistas. Por uma nova perspectiva, pesquisadores têm evidenciado que o empreendedor deve ser um agente de mudança e fomentador de transformação social. É esse empreendedorismo que pretendemos fomentar”.
Nos processos seletivos, serão avaliados critérios como constituição e capacidade do time de empreendedores, impacto socioambiental e modelo de negócios, que deve demonstrar atratividade, eficiência e viabilidade financeira.
Ação pela diversidade
Apenas uma de cada cinco startups criadas no Brasil tem uma mulher como fundadora, segundo a Associação Brasileira de Startups (Abstartups). Os dados da entidade revelam que falta diversidade no ambiente empreendedor. Pessoas autodeclaradas brancas são 72% das fundadoras das startups, e as autodeclaradas heterossexuais são 92%. Quase 80% das startups estão nas regiões Sudeste (53%) e Sul (24%). Os números foram apresentados durante o evento O papel do empreendedorismo na CT&I por meio do qual a Fundepar comemorou seus 10 anos de atuação.
O presidente da Abstartups, Luiz Othero, propôs soluções para o cenário pouco diverso, como estímulo a conexões entre diferentes regiões, desenvolvimento de políticas públicas para o setor, educação empreendedora para startups e fortalecimento das comunidades. “Iniciativas como as da Fundepar são importantes para diversificação do cenário”, afirmou
Um dos painéis do evento reuniu uma empresa de dispensa medicamentos em modelo por assinatura, fundada por três mulheres, que à época da fundação eram estudantes da Faculdade de Farmácia da UFMG, e uma spin-off da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
Rânik Guidoline, CEO da Lume Robotics, fundada em 2019 na Ufes e investida pelo Seed4Science, lembrou que a gestão de um negócio não era expertise desenvolvida na universidade, por isso o apoio da Fundepar foi decisivo para o sucesso da empresa, que hoje entrega sistemas de automação de veículos para a indústria e o campo. “Entendíamos de tecnologia e de produzir conhecimento acadêmico. Tudo mais nos desafiava, e recurso não tínhamos. O primeiro aporte nos possibilitou estruturar a equipe e a empresa, avançar e continuar crescendo”, contou.
De acordo com Samilla Dornellas, cofundadora da Far.me, o apoio à gestão oferecido pela Fundepar foi muito importante para a história da empresa, adquirida em fevereiro deste ano pela Viveo, holding de negócios de fabricação e distribuição de materiais para a área da saúde. Segundo ela, a Far.me enfrentou dificuldades provocadas, sobretudo, pelo estranhamento com mulheres à frente de um empreendimento disruptivo. “Não é mesmo um ambiente acolhedor da diversidade”, disse.
Por isso, o anúncio de um fundo de apoio a tecnologias sociais, que deverá estimular a diversidade no cenário empreendedor, terá impacto positivo para as empresas investidas e para todo o ecossistema. “Os dados evidenciam um desafio a ser assumido pela Universidade, que é contribuir para que diferentes perfis de empreendedores tenham possibilidade de investimento”, avaliou a mentora de negócios de favelas Juliana Morais, que também é professora da Fundação Dom Cabral. Para ela, além de garantir acesso aos bancos escolares por meio de ações afirmativas, a UFMG pode, por meio de seus equipamentos de empreendedorismo e inovação, ampliar o apoio aos pequenos negócios. “Deixo esse palco com um convite: UFMG na favela”, ela finalizou.