Mudanças na paisagem da Amazônia extinguem espécies e pioram qualidade do solo
Com participação de pesquisadores do ICB, artigo publicado na PNAS enfatiza urgência do combate ao desmatamento
O modelo de desenvolvimento baseado no uso da terra como recurso de produção tem ameaçado o meio ambiente em vários países do mundo. Estudo realizado na Amazônia, com participação de pesquisadores do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG, avaliou o impacto da atividade humana na exploração das terras em florestas tropicais. O trabalho foi publicado no periódico científico Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).
“A conversão de florestas para pastagens ou agricultura mecanizada leva a uma redução, que varia de 18% até 100%, no número de espécies de formigas, besouros, aves e árvores. Já quando a floresta é convertida para agricultura, nós encontramos as maiores mudanças em biodiversidade, estoques de carbono e propriedades do solo”, resume o professor Ricardo Solar, do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do ICB.
Os dados coletados da literatura, sobre a velocidade da transformação da paisagem na última década (2006-2019), foram comparados com os dados capturados em 310 locais, envolvendo mais de 2 mil espécies de árvores, cipós, aves e insetos. Também foram avaliados os estoques de carbono e as propriedades do solo. A área estudada abrangeu duas regiões do Pará: Santarém e Paragominas.
Segundo Ricardo Solar, a Amazônia se aproxima de um “ponto de inflexão”, e as descobertas indicam prioridades de conservação e regeneração urgentes. “A área desmatada na Amazônia para pastagens é 60 vezes maior do que as usadas para agricultura. Em média, essa mudança é de 24 mil km² por ano, o que torna a transição para pastos ainda mais prejudicial para a floresta”, avalia o cientista.
Por outro lado, o professor lembra que, quando se promove a recuperação de áreas de pastagem, agricultura, ou que tenham sofrido perturbações como queimadas, as chamadas florestas secundárias, resultantes do processo natural de regeneração da vegetação, provocam o aumento da biodiversidade e os estoques de carbono no local. “Garantir ou preservar o crescimento de florestas secundárias pode dobrar o número de espécies de árvores e trazer grandes benefícios”, informa.
Usos não florestais
De acordo com o professor Cássio Alencar Nunes, da Universidade Federal de Lavras e da Universidade de Lancaster, que lidera o estudo, o desmatamento de florestas primárias para a criação de pastagens é a mais prejudicial intervenção no uso do solo.
Ele destaca que, no caso da conversão de uma área de pastagem de gado para a agricultura mecanizada intensiva, observa-se uma queda de 30% na diversidade de formigas, e de 59% na de pássaros.
Outro coautor, o professor Jos Barlow, da Universidade de Lancaster, chama a atenção para a importância desses resultados para a proposição de políticas públicas. Ele reforça que, para evitar a degradação e aumentar a permanência das florestas secundárias, será imprescindível “transformar a maneira como a Amazônia está sendo gerenciada, incluindo uma integração muito maior entre ciência, política e práticas locais”.
Como a biodiversidade foi a mais afetada pelo uso do solo entre os componentes do ecossistema analisados, Barlow defende que ela seja incluída nas ações de mitigação de mudanças climáticas. “Que isso possa ser enfatizado na próxima conferência das Nações Unidas para as mudanças climáticas”, alerta.