UFMG desenvolve fungicida com nanopartículas de nióbio
Atóxico e de baixo impacto ambiental, produto tem potencial para proporcionar grandes benefícios ao agronegócio
Pesquisadores da UFMG desenvolveram um fungicida de tecnologia nacional, totalmente atóxico e com eficiência comprovada em testes in vitro, in vivo e no campo. O fungicida, que também apresenta características de bioestimulação, vale-se de uma tecnologia que usa nanopartículas de nióbio em sua composição e teve como resulta um produto inovador e versátil.
“Quase todo fungicida usado no Brasil é importado e, além de ter custo alto, é um produto de origem química/sintética que demanda cuidados em sua utilização devido aos diferentes níveis de toxidez. Desenvolvemos uma molécula de nióbio inédita e encontramos uma alternativa de grande potencial para esses problemas”, explica o professor Luiz Carlos Oliveira, do Departamento de Química da UFMG.
O uso das nanopartículas de nióbio na agricultura começou a ser estudado pelo grupo do professor Oliveira em 2020, em decorrência do dilema enfrentado pelo agronegócio, especialmente com o complexo de doenças fúngicas hoje instalado na cultura de soja. O fungicida criado pelos pesquisadores da UFMG é inorgânico – tem como base um mineral, o nióbio – e de baixo impacto ambiental. Atóxico, ele não provoca irritação ocular, efeito comum nos defensivos agrícolas hoje comercializados.
Laboratório e campo
Na primeira fase de testes (in vitro), o produto já apresentou resultados promissores. Em um segundo momento, os testes foram realizados in vivo e, finalmente, no campo. Nesta última etapa, as avaliações são feitas por empresas especializadas em ambientes de testagens, onde a tecnologia enfrenta os desafios da vida real. Os primeiros testes estão sendo feitos em culturas de soja e têm confirmado os resultados apresentados nos laboratórios.
Luiz Carlos Oliveira explica que os testes mostram que a aplicação da nanoestrutura induz a formação de uma espécie de nanopelícula protetora nas folhas da soja, que atua como barreira molecular fotoativa e propicia uma proteção física, além de interferir no processo respiratório do fungo, evitando a sua proliferação. O professor lembra que estudos já realizados em diferentes cultivos, como sementes de milho, trigo e amendoim, também mostraram que o fungicida parece atuar como solução pós-colheita, propiciando proteção eficaz de grãos e sementes que ficarão armazenadas.
Ao comparar a eficácia do produto desenvolvido pela UFMG com aqueles mais usados no mercado, os estudos mostraram que a margem na eficiência de inibição do fungo foi similar em todas as concentrações testadas, com resultados próximos aos 100% de inibição quando em concentrações mais altas.
Com relação aos estudos feitos para a ferrugem de café, doença provocada por Hemileia vastatrix, que provoca a queda precoce das folhas e a secagem dos ramos, os resultados, segundo Oliveira, foram ainda melhores quando comparados aos obtidos pelo produto-padrão, importado e mais usado em âmbito mundial. Nesse caso, a tecnologia da UFMG apresentou eficácia mais de duas vezes superior.
O engenheiro agrônomo Francisco Adriano de Souza, pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo em Sete Lagoas, alimenta expectativas positivas em relação ao produto. “Se os resultados apresentados até o momento pelos pesquisadores da UFMG se confirmarem, e essa tecnologia passar pelo crivo de segurança ambiental e toxicológico, teremos um grande achado, a descoberta de uma nova classe de fungicidas”, afirma o pesquisador. Souza alerta para a necessidade de mais investimento nas pesquisas para que se conheça, com profundidade, a forma como o produto age e os seus eventuais efeitos colaterais. “Essa descoberta pode contribuir para a segurança alimentar mundial”, prevê o pesquisador.
A efetividade da tecnologia em diferentes solos e climas está sendo testada em plantações de soja em cidades de Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso e Paraná. Neste último estado, o fungicida também já está sendo testado em culturas de milho e de trigo.
Mercado bilionário
O Brasil é o quarto maior consumidor de defensivos agrícolas do mundo (6,67%) em volumes totais, ficando atrás apenas da China, o maior consumidor mundial (41,94%), da União Europeia (13,71%) e dos Estados Unidos (11,96%). Esses produtos são utilizados especialmente nas culturas de soja, milho e algodão (54,84%), cana de açúcar (12,39%) e café (2,70%). Sua utilização no mercado mundial movimenta cerca de US$ 60 bilhões, considerando as 20 maiores indústrias do setor, sendo US$ 12,9 bilhões somente no Brasil.
A tecnologia desenvolvida pelos pesquisadores da UFMG tem potencial para movimentar o mercado, que hoje é dominado por dez empresas globais. De acordo com o professor Luiz Carlos, o pedido de patente já foi protocolado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), e a tecnologia está licenciada para a Nanonib, startup com plataforma tecnológica, sediada no Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC), que desenvolve materiais avançados de nióbio para aplicações nas áreas de saúde, energia, cosméticos e para o agronegócio.
A nanopartícula de nióbio já é objeto de pesquisas na UFMG há mais de dez anos, com ênfase em tecnologias direcionadas aos cuidados com a saúde, sobretudo em materiais para a odontologia, cosméticos e energia renovável. Os estudos da UFMG com a nanopartícula já resultaram no depósito de 11 pedidos de patentes no INPI. Na pandemia, os estudos acabaram direcionados ao combate ao vírus Sars-CoV2, resultando em produto com ação antisséptica para as mãos que inativa o vírus instantaneamente.